20.10.05

Aos que nasceram hoje de manhã
mais de cansaço caem levantando
as horas miriápodes do sarro,
aos que perfazem anjos pela carne,
aos que agradecem chuva e amamentam
os filhos do mau tempo,
aos outros sós que vergam,
aos que deram a pele,
aos negros,
aos leprosos,
aos longe do açúcar,
aos doidos,
aos últimos,
aos meninos de choro,
aos pulhas,
aos presos,
aos palhaços,
aos limpa-chaminés de onde não as há,
aos amantes em causa,
aos que lambem o peso,
à menina Zulmira,

aos que têm anémonas nos olhos
a voz abrindo atalhos alarga na clareira
a mesa do banquete.

Pedro Tamen
Pedro Tamen nasceu em Lisboa a 1 de Dezembro de 1934. Licenciado em Direito, publicou os seus primeiros poemas nos «cadernos de cultura» Anteu, de que foi co-orientador e de que saíram apenas dois números, ambos editados em 1954. Dirigiu o jornal Encontro, órgão da Juventude Universitária Católica, sendo seu chefe de Redacção até 1957. Foi dirigente cineclubista (Centro Cultural de Cinema) e publicou o seu primeiro livro Poema para Todos os Dias em 1957, em edição de autor. Foi director-adjunto da revista Flama e dirigiu a editora Moraes entre 1958 e 1975. Fez, durante algum tempo, crítica literária no semanário Expresso, e pertenceu à direcção da Associação Portuguesa de Escritores entre 1973 e 1975. Foi presidente do PEN Clube Português entre 1987 e 1990 e administrador da Fundação Calouste Gulbenkian. É autor de inúmeras traduções para português de autores consagrados (Lautréamont, Proust, Breton, Foucault, Flaubert, etc…) Tem a sua poesia reunida em Tábua das Matérias. (in Tábua das Matérias, Círculo de Leitores, Fevereiro de 1995)