EDUCAÇÃO CÍVICA
Faz-se de tudo
o abano da anca
o olho sorridente
o rebolado
perante o presidente
da república
faz-se o bailado
e a pirueta
para agradar
e arejar o presidente
do conselho
lubricamente
mostra-se o joelho
aos ministros todos
lança-se
simpatia a rodos
aos generais
e aos marechais
também aos furriéis
se for preciso
afinal
o que é preciso
é ter juízo
faz-se de tudo
sempre a abanar
a anca
o abano da anca
o olho sorridente
o rebolado
perante o presidente
da república
faz-se o bailado
e a pirueta
para agradar
e arejar o presidente
do conselho
lubricamente
mostra-se o joelho
aos ministros todos
lança-se
simpatia a rodos
aos generais
e aos marechais
também aos furriéis
se for preciso
afinal
o que é preciso
é ter juízo
faz-se de tudo
sempre a abanar
a anca
Mário-Henrique Leiria nasceu em Lisboa em 1923. Frequentou a Escola de Belas Artes, donde saiu apressadamente. Entre 1949 e 1951 participou nas actividades da movimentação surrealista em Portugal. Depois começou a andar de um lado para o outro. Teve vários empregos, marinha mercante, caixeiro de praça, operário metalúrgico, construção civil (não, não era arquitecto, carregava tijolo), etc. pelas terras onde andou: a Europa cristã e ocidental, o Mediterrâneo norte-africano, o Oriente Médio e até, dizem, os países socialistas. Não ia aos Balkans porque tinha medo, todos lhe diziam que lá os bigodes eram enormes e as bombas estoiravam até no bolso. Um dia teve que passar por lá. Os bigodes eram realmente grandes, mas toda a gente sabia rir. Tirou o casaco e bebeu que se fartou. Em 1958 meteram-se-lhe ideias na cabeça e foi até Inglaterra, para aprender coisas. Não aprendeu e voltou. Entre 1959 e 1961 foi casado e não fez mais nada. Em 1961 foi para a América Latina donde voltou nove anos depois. Por lá, conseguiu ser, entre outras actividades menos respeitáveis, planejador de stands para exposições, encenador de teatro e até director literário de uma editora. Fizera progressos. Agora está chateado, vive em Carcavelos e custa-lhe muito a andar. Temo colaborado em várias revistas e jornais nacionais e não só. Está publicado em algumas antologias, tanto aqui como no estrangeiro. Este é o primeiro livro que tenta publicar em Portugal. Realmente, está muito chateado. (in Contos do Gin-Tonic, 2.ª edição, Editorial Estampa, 1973) Morreu em Cascais, de degenerescência óssea, no dia 9 de Janeiro de 1980.
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