A PÁTRIA
A dor de feridas. A sede nas areias do deserto,
a fome nos castelos sitiados, a morte no campo
de batalha. Dizem, isto é a pátria, a tua pátria.
Mas também te podem dizer
és novo, és velho e a dor das feridas percorre-
-te, feroz, o anódino corpo. A fome leva-te ao
roubo em plena cidade e é tão difícil encontrar o
que pear, como acalmar a sede no deserto. A morte
pode vir numa cama de hospital, sozinho, a meio
da abandonada noite. Dizem
isto é a tua vida, a quadra dos teus belos dias
passageiros. Isto é ainda a tua pátria. E tudo
parece trair-te
deus, os amigos, os deuses. Palavras, todas elas,
de fria e morta expressão. Mais vale
que nos crave o rosto e o peito e nos esmague os
colhões
a garra de um lince e que nos devore no fogo
de quem descobre um segredo que não temos, que
não, que nunca existiu.
a fome nos castelos sitiados, a morte no campo
de batalha. Dizem, isto é a pátria, a tua pátria.
Mas também te podem dizer
és novo, és velho e a dor das feridas percorre-
-te, feroz, o anódino corpo. A fome leva-te ao
roubo em plena cidade e é tão difícil encontrar o
que pear, como acalmar a sede no deserto. A morte
pode vir numa cama de hospital, sozinho, a meio
da abandonada noite. Dizem
isto é a tua vida, a quadra dos teus belos dias
passageiros. Isto é ainda a tua pátria. E tudo
parece trair-te
deus, os amigos, os deuses. Palavras, todas elas,
de fria e morta expressão. Mais vale
que nos crave o rosto e o peito e nos esmague os
colhões
a garra de um lince e que nos devore no fogo
de quem descobre um segredo que não temos, que
não, que nunca existiu.
João Miguel Fernandes Jorge nasceu no Bombarral em 1943. Poeta, ficcionista, ensaísta e crítico de arte, licenciado em Filosofia pela Universidade de Lisboa, foi professor do ensino secundário e professor de Estética na Escola de Cinema do Conservatório Nacional. Pode-se dizer que foi a partir da publicação do seu primeiro livro, Sob Sobre Voz (1971), que a geração de 70 passou a ser identificada como tal. E com ela aquilo a que foi chamado, com maior ou menor propriedade, o “regresso ao real”, por oposição ao formalismo da linguagem verificado na década precedente. Autor de uma obra extensa, as colectâneas de poemas começaram em 1987 a ser coligidas em volumes de Obra Poética. Outra constante é a actividade ensaística no domínio das artes plásticas e da fotografia, com intervenção regular na imprensa (A Capital, O Independente, Semanário, Expresso, etc.) e em diversas revistas da especialidade. Poemas seus encontram-se dispersos por revistas como O Tempo e o Modo, Colóquio-Letras, Nova, Sema, Raiz & Utopia, Belém, Europe, etc. *
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home