12.6.07

A GALERIA DO PRÍNCIPE

Há mais Nada para além do nada. De uma entrevista a João Tabarra, duas respostas a duas perguntas que penso também serão do agrado da Maria João:

Como é que se calcula o desejo de ser artista dentro daquilo que foi o teu ambiente familiar e depois como fazes essa progressão para uma experiência com os média e de que modo isso refunda a tua intenção artística e a tua vida?

Dentro do meu ambiente familiar digo-te as coisas de uma forma muito directa: tratou-se de fuga para a frente. Ou seja, o que eu me lembro desde miúdo é de que não gostava de nada do que me rodeava. Todos os códigos sobre os quais fui educado resumiam-se à máxima: o importante é encher a barriga. Naquela compressão que era o meio familiar só me restou a fuga, mas uma fuga não pensada, não programada. Por outro lado, naquela altura não havia interesse nenhum pelos jovens artistas, nem todo o circo em redor dos novos artistas que há hoje. A ideia do jovem artista não existia sequer. Agora existe e tornou-se uma ideia de mercado. Agora temos esta aura que existe à volta do jovem artista que é alimentada pelo processo acumulativo e aglutinador capitalista, onde é o mercado que manda – uma necessidade de renovação permanente e de visibilidade imediata. Dou-te um exemplo. se a arte em si fosse importante, se a proposta artística e do artista circulasse, as exposições não se circunscreveriam ao acto inaugural na capital. Mas essa circulação está armadilhada porque toda a atenção mediática recai sobre a exposição inaugural e mais nada, a atenção esgota-se aí. Os média, os críticos celebram a exposição mas se esta for para a Guarda, para Évora, então deixa de lhes interessar. Quem manda é uma crítica ou uma notícia de jornal. E se a visibilidade já acabou, então já não interessa a circulação. O que interessa não é a arte, não é a tua proposta, nem sequer é o artista ou um projecto, mas simplesmente o acontecimento mediático que prevê também uma celebração da força da própria estrutura que expõe o artista. Se isto é perverso? É. Mas esta é a realidade.

(…)

Para ti a arte é também um gesto político? De que modo distingues a arte da política e de que modo as interpretas? E de que modo, sendo a arte apreciada por uma elite muito restrita pode almejar outra coisa senão produzir um jogo perverso para regozijo do sistema capitalista, em que a própria subversão é um valor de mercado e mesmo um valor luxuoso, uma espécie de bem dispendioso só acessível às classes altas e só entendível pelas elites do conhecimento, as elites culturais? A arte por mais subversiva parece sempre servir o poder/saber.

É claro que sim, e como sabes, sempre afirmei, a arte é um acto político – o que não tem nada que ver com a ideia menor do que comummente entendemos por política. Falo da organização, partido, parlamento, governo e por aí fora. É um gesto que pode ser de confronto, de crítica, de afirmação, um espaço para a proposta, para a dúvida, penso ser fulcral entender isto de forma a escolher como poder actuar numa sociedade do conhecimento. Agora se me dizes que a arte sempre foi de e para as elites, de fruição restrita, algo como um acessório para o sistema capitalista, bem, é verdade. É verdade que o que faço não entendo como popular e é verdade que, e para utilizar outros termos, a revolução que virá também já está contabilizada pela máquina devoradora que é o nosso sistema capitalista, pois é um sistema englobante, ele não exclui nada, simplesmente actua em apropriação e engloba. Mas João ou Joões [João Urbano e João Gusmão], a revista NADA não é certamente um anexo do Borda d’água e os seus leitores são certamente uma elite. Espero que não exista aí nenhum resíduo romântico… É claro que eu, nós precisamos do mercado. Eu preciso de atribuir um valor ao meu trabalho e ainda mais preciso muito que o comprem… com isto não se pode encurralar ninguém; parece que a arte tem que ter qualquer coisa de divino ou de despojamento paras atingir o quê?... O puro?... Não, nesse buraco eu não entro. É verdade que, e não me querendo repetir, toda a arte, mesmo a mais subversiva, acaba sempre por servir o poder mas também acredito, e falo de mim enquanto autor, enquanto homem, que há maneiras e maneiras de actuar na arte e ainda não me viram baixar os braços, muito menos a guarda. O problema é que com o total domínio do inconsciente, do vale tudo, do folclore, o espaço de poder que a «indústria cultural» dispõe para actuar ocupa praticamente tudo, e é extremamente difícil a um receptor menos atento distinguir entre o que é hoje arte ou que tipo de arte podemos e devemos propor e como o fazer. E toda a panfernália de materiais glamorosos que os milhões de artistas e comissários afirmam ser necessário, aí sim, parece que estamos cada vez mais dentro da «Nova Galeria do Príncipe».

Caso pretenda adquirir a NADA pode contactar os editores através do e-mail:
mail@nada.com.pt. Pode ainda visitar o sítio da revista em: www.nada.com.pt.

2 Comments:

At 5:44 da tarde, Blogger MJLF said...

Ó Henrique, tu bem sabes que a Maria João fica exitada com estas coisas, o Tabarra para além de ter um bom trabalho artistico, é muito lucido nas suas afirmações.

 
At 11:26 da tarde, Anonymous Anónimo said...

:)

 

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