12.10.06

C

a página
cheia de erros simétricos (e assimétricos)
ou é-SE
é-SE perante a página, objecto relativamente estável que induz no nosso corpo uma
grande perturbação (atracção repulsa maiores excitação terror liberdade necessideza incerteza maiores)
pode-SE circular avançar recuar em frente mas não fazer com que ELE não esteja LÁ
e se fosse SE o objecto estável perante a página subitamente muito movediça muito areia
ou ELE
circulando fixo por dentro
ou ELE é por SI só a página
ou então
será proibido (se bem que incluído no branco
se bem que imbuído)
e SE que espera ELE (the number you are calling knows you are waiting)
e como é que pode ser que as palavras estejam nos lugares no momento da acção, que as chama
ou as autoriza a estarem LÁ? Ou ainda mais inquietante
como é que pode ser que haja acção na página na própria ausência de qualquer palavra

e são aterradoras as circunstâncias da escrita em que a página é a frente da recusa

trata-se apenas de alguns pontos perdidos ligados por um fio creio eu

a página e as amígdalas e um istmo de sofrimento
com frequência por vezes a página sofre de amígdalas
irrespira cruelmente e deve-SE dizer mesmo assim em voz alta


Tradução de Nuno Júdice.

Dominique Fourcade

Dominique Fourcade nasceu em Paris no ano de 1938. Poeta e crítico de arte, estreou-se em 1961 com Épreuves du pouvoir. Desde então publicou vários livros de poesia e sobre arte, dedicando especial atenção às obras de Matisse e de Cézanne. Com uma obra poética vasta, destacam-se, entre os seus livros, Le ciel pas d’angle (1983), Outrance utterance et autres élégies (1990), Il (1994) e, mais recentemente, Est-ce que j’peux placer un mot? (2001) e En laissse (2005).