6.11.06

KOSHER

Kosher
Pagas-me o café, não te conto a minha vida. Posso cair nesse buraco azul, olhar como quem aspira universos sem ar. Tenho o sapo seco numa estante, encontrei-o na Zambujeira e ele nunca mais se mexeu.

Eu sei que tu precisas de energia, alimenta-te da minha demora - Despe as meias, faz de conta que precisas de estar ao fundo da cozinha, o único enquadramento em que é possível ver-te, - não te esquecerei. Temos vidros, livros, anémonas – podemos fazer um espectáculo só nós dois, mas por favor. Eu sou o eleito, a graça que desceu. Eu tenho braços quase de mulher e sou um mutante poético com orelhas de abano. Tenho uma relação estável com as fadas, matamo-nos compreensivelmente nos dias que expiram o mais sumido suspiro. Já disse que não escrevo romances, já passei essa fase. Como será ter um coração nobre? Como será querer muito uma coisa só, e tê-la? O mesmo de sempre, vitória, sorriso, engano, eternidade. O dia seguinte.

Por favor, pago-te o café. Não me contes a história da tua vida.

Rui Costa

8 Comments:

At 12:24 da manhã, Blogger margarete said...

épá!
gosto muito.
gosto tanto.
fabuloso
mesmo, Rui.

 
At 12:28 da manhã, Blogger margarete said...

«Despe as meias, faz de conta que precisas de estar ao fundo da cozinha, o único enquadramento em que é possível ver-te, - não te esquecerei»

mesmo.

 
At 12:31 da manhã, Blogger margarete said...

«Como será querer muito uma coisa só, e tê-la? O mesmo de sempre, vitória, sorriso, engano, eternidade. O dia seguinte.»

:)

 
At 7:41 da tarde, Blogger MJLF said...

"Pagas-me o café, não te conto a minha vida", é mesmo isso, " Como será ter um coração nobre?", bravo, bravo.
Maria João

 
At 7:42 da tarde, Anonymous Anónimo said...

"Como será ter um coração nobre? Como será querer muito uma coisa só, e tê-la?".Não sei e não conheço ninguém que tenha ou assim queira e obtenha.É curioso acreditares que é possível:)Mas eu não sou poeta/escritor(a).Talvez por isso ou talvez porque me falte o "golpe de asa" para crer no impossível.
PB

 
At 9:04 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Gostei muito e se o objectivo era não romancear no sentido poético da coisa, então meu caro, falhaste! e ainda bem...humanizaste a coisa.

 
At 1:31 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Estavam lindos a Claudia e o Alain, abraçados nesse sofá castanho com ligeiro tom de beige. Ela não se vai esquecer de despir as meias, sobretudo quando tiver muito frio.

 
At 10:33 da tarde, Anonymous Anónimo said...

parece que há uns bons leitores por aí ;)
Rui Costa

 

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