18.9.05

GERADOR DE TEXTO

Já há bastante tempo que um professor chamado Pedro Barbosa se dedica ao desenvolvimento de geradores de texto. O meu amigo José João também tem feito algumas experiências neste campo. Os textos que transcrevo abaixo são dois resultados dessas experiências. Respondam por favor: isto é literatura?
gorila

ó resplandescentes águas ó espelho lembradiço
das mercadorias
um telhão que se translucida e acasala rectilíneo
ó argolada da cidra ó embrulhador franjado do estalo
onde a radiodifusão das receptividades brilha derramando-se
sobre o afixo
que na dulcineia do acirrante deísmo engravida
lúbrico de companheirismo e sintetização
-*-
Apodreço o teu washingtoniano sémen de estirador
a tua platónica negrura volumosa
a tua minguante toma de folheio
a tua celebridade exótica sempre eruptiva
.
Por ti eu corto a preexistente antiguidade de um regresso
que tremula e provém a sua coincidência
que se barateia e rastilha ao teu magnete de microscópio
ou é goiabada das tuas imediações de novidade
.
Se remasco algum engate não o emboto
porque quero oferecer-te a supersticiosidade de um petróleo interplanetário
que chie e escarna nas tuas produtividades inexplicáveis
e seja um tom ou um milhafre um contragolpe concernente
.
Ofereço-te esta estupidificante aeronáutica esta toxicidade de carnagem
para que expludas a enchente fortidão
de um satanismo de plenas hospedarias
porque é por ti que espalho é por ti que malfaço
porque espalho o traquejo resfriador do teu janelo
.
.
A. Ares Redutível
Rui Costa

17 Comments:

At 11:13 da tarde, Anonymous Anónimo said...

A poesia pela sua natureza dual desfaz-se e refaz-se nos olhos de quem a lê, mais ainda que nas mãos de quem a escreve. Será esta dualidade sentido, não-sentido que faz com que este género de expressão seja considerado árido e difícil. Não se faz translúcida não se apresenta em simpáticas relações lineares entre as palavras e o significado.
Não se define. Mas estas coisas dos humanos não são dadas a definições taxativas . Se por ventura assim fosse, depois de tantas páginas, poemas, ensaios e longas horas de discussão, já alguém tinha conseguido definir o que é o amor! Não é com certeza por falta de tentativas...há sempre alguém a fazê-lo desde que a humanidade se assume como tal. Facto indiscutível é que nunca vi ninguém que ame preocupado com a definição do amor...do mesmo modo como quem tem fome não costuma ter grandes considerações com a cutelaria.
Da poesia nada sei.
Da qualidade de escrita nada sei.
Sei apenas que as palavras, são uma necessidade intrínseca ao ser humano e que todas as formas de expressão se transformam entre o emissor e o receptor, aí sim nesse mudar de entendimento, nesse levíssimo toque no íntimo de quem vê um quadro, ouve uma música, reside todo o encanto da arte ser arte para seres que são humanos.

Aurora Silva

 
At 11:40 da tarde, Blogger MJLF said...

A pergunta não está bem colocada porque deve-se destinguir o uso da palavra literatura no sentido classificativo e valorativo. Acho que queres perguntar se é boa literatura, será? Em termos classificativos, literatura engloba a boa e a má literatura.
Maria João

 
At 11:43 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Aurora: 1. se tivesses uma editora publicarias um livro (de que gostasses) escrito por um computador?;2. a fronteira homem-máquina esbate-se (assim como a fronteira homem-mulher, ou orgânico-inorgânico, etc.):quer dizer que a autoria vai ser cada vez mais difícil de determinar;3.o certo é que isto do gerador de texto chama a atenção para o conceito de "realidade textual", por oposição a uma linguagem referencial que vise descrever uma realidade exterior (referente); mas mesmo este distinção se esbate porque a base de dados fornecida ao computador, com base na qual ele vai gerar um texto, funcionaria como a "realidade da vida" para o escritor "normal" (que também é feito de bases de dados);4.quanto ao amor, é como se o último fosse sempre o primeiro:um gajo nunca sabe.
Rui Costa

 
At 12:03 da manhã, Anonymous Anónimo said...

etanol: ok, achas que qualquer texto é literário? ou só um texto "literário" (para excluir um manual de instruções, por exemplo)? E um manual de instruções pode ser literatura ou não? Segundo o teu argumento parece que tudo é valorativo, uma vez que a "classificação" de algo como "literatura" já pressupõe um juízo de valor.Não digo que não concorde com isto. Só que se assim for não é possível, parece-me, distinguir termos classificativos de termos valorativos. Como dizia na resposta acima, as distinções esbatem-se. Há quem diga que teve má ideia o primeiro gajo(a) que se pôs a dividir o mundo.Mas parece-me que tens razão a desvalorizar a autoria em favor do resultado (se concordares que a poesia se escreve com palavras-eu até acho que dentro de algum tempo não se vai poder assinar os livros porque não vai ser possível, estando em rede, identificar o autor).
Rui Costa

 
At 12:23 da manhã, Blogger MJLF said...

O uso de processos aleatórios na criação artistica não é novidade, em termos literários Max Bense nos anos 60 já fazia experiencias com computadores nesse sentido, em termos musicais John Cage foi um grande impulsionador destas coisas. Estes textos levantam várias questões e uma delas deve ser esclarecida à priori: uma máquina sozinha não pode produzir literatura porque isso apenas pode ser feito por um ser humano, não foram as máquinas a inventar a palavra literatura. Um computador pode é fazer uma determinada combinação de palavras, gerar um texto através de dados que são colocados num determinado programa. Depois, uma criatura humana tem de executar o gesto de candidatar os resultados desses textos a literatura. A partir do momento em que essa criatura escolhe e propõe o texto tornasse literatura, só depois poderá ser considerada boa ou má literatura.

 
At 8:22 da manhã, Blogger luis ene said...

a verdade é que pode ser lido, e se pode ser lido alguém pode classificá-lo como literatura. Digo apenas isto porque já disseram melhor, como por exemplo que as palavras são introduzidas pelo homem e o programa também, pelo que se aproximará da escrita automática sem inconsciente. Talvez a pergunta devesse ser "isto é arte?", remetendo para os diversos mecanismos de produção artística.

 
At 11:07 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Rui:

1)- Palavra que não sei. Acho que dependia da “qualidade que encontrasse na dita obra”, mas meu caro uma gaja das ciências como eu a gerir uma editora era um desastre anunciado pelo que acho, não irei perder muito tempo a pensar no assunto.

2) Essas fronteiras sempre se esbateram, todos nós nos debatemos com elas, tacteando caminhos entre areias movediças. Fenómenos como entropia, confusão e reacção fazem parte até da vida daqueles que completamente os ignoram. Quanto à autoria...pois, haverá no universo artístico alguma coisa de realmente original? Ou andaremos todos a tentar dizer sempre o mesmo variando apenas a forma? Quais pardais em galho quebradiço.

3) No fundo no fundo, todos somos geradores automáticos de(...) existe muito de aleatório nas palavras que escolho aqui. Não serão apenas grafismos aplicados à transmisão de pensamento/sentimento? Se outras armas me tivessem sido dadas, ou eu as procurasse, talvez escrevesse uma música ou pintasse um quadro em vez de.

4) Quanto ao amor, há sempre algo de perene na dádiva de uma emoção. O importante não é de que se gosta mas como se gosta. Gostaria eu agora, que não me doesse o estômago, e que este lindo sol de outono me aquecesse as costas, mas parafraseando-te: Nós não somos um céu azul.

Aurora Silva

 
At 1:36 da tarde, Anonymous Anónimo said...

amor: s.m.sentimento que nos impele para o objecto dos nossos desejos etc: as definicoes estao no dicionario(:coleccao alfabetada de uma lingua ou de qualquer ramo do saber,com arespectiva significacao etc).dificilimo de definir:os modos de amar de cada um(e claro que enquanto a neurologia nao alcancar o desenvolvimento da fisica ou assim,so poderemos definir os de nos mesmos).isto e arte?ora ai esta uma questao obsoleta.evidencia:ate um plagio pode ter muita novidade.sera assim tao dificil, sera preciso um refinamento extemo para distinguir a poesia do seculo passado da do renascimento e assim por diante?como e que se pode afirmar que ja esta tudo feito se a liberdade total na arte so foi alcancada ha nem sequer un seculo.normalmente e-se grosseireeeeeerriiimo ao sentenciar que tal poeta so vem dar uma forma nova a uma tradicao.limitar se a dar uma forma nova nao e mais que alterar a formulacao , o grafismo etc.se acha que o cancioneiro nao e muito diferente do surrealimo,por exemplo, entao a senhora silva nao difere de um burro ou un camelo...ou de um primata!!( aescolha zoologica foi aleatoria...pronto,nao foi,admito a minha paixao pela piada a "la paque mayer pros pequeninos" ou "a la batatoon pros crescidos")tal como eu ja que somos todos feitos de atomos.quao nihilista isso e isto seria?

 
At 2:04 da tarde, Anonymous Anónimo said...

EXMO Sr:
o senhor coisinho da anaconda emplumada

começo por agradecer a definição de dicionário que com certeza me será muito útil para resto da minha vida.

A única coisa que quis dizer foi que todo isto é muito discutivel.
Lamento que considere a minha intervenção grosseira, não tive intenção de ofender minguém.
De qualquer modo, não tenho pretensões de dar/receber sentenças sobre o que está bom mau ou optimo, sou a 1ª pessoa a admitir que não sou literada na mátéria.
As opiniões valem o que valem, a minha concerteza não será de grande valor, mas devo recordar-lhe que opiniões no post original foram pedidas.


Aurora Silva

 
At 3:34 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Ó coisinho...:re-criar também é criar; a revolução também é um rearranjo das energias da respiração. Mas sim, cabe-nos fingir que somos bons (e somos), porque o mundo é nosso e se deus existe o problema é dele.Agora, vais desculpar-me: se a Aurora não tivesse qualquer coisa de primata não estaríamos nós aqui a "perder" tempo com ela, certo:)?
Rui Costa

 
At 4:44 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Reporto-me à sabedoria popular: “Cada macaco no seu galho”- E este definitivamente não é o meu. A minha produção letrária de momento intitula-se “Ecotoxicological evaluation of some indicators used in classic titrations” e provavelmente não interessa nem aos anjinhos (assumindo que existem).
De qualquer modo, agradeço ao Rui ter-me apresentado este blog que tem servido acima de tudo para descansar os olhos da ciência e para aprender com quem sabe.
Regresso ao meu galho, tomando a liberdade de vos deixar este poema, que pelo menos a mim (na minha ileterada ignorancia, que nunca sei quem é o nish ou esses gajos de que falam) diz muito.

Ítaca

Quando partires de regresso a Ítaca
deves orar por uma viagem longa,
plena de aventuras e de experiências.
Ciclopes, Lestrogónios, e mais monstros,
um Poseidon irado – não os temas,
jamais encontrarás tais coisas no caminho,
se o teu pensar for puro, e se um sentir sublime
teu corpo toca e o espírito te habita.
Ciclopes, Lestrogónios, e outros monstros,
Poseídon em fúria – nunca encontrarás,
se não é na tua alma que os transportes
ou ela os não erguer perante ti.

Deves orar por uma viagem longa.
Que sejam muitas as manhãs de Verão,
quando, com que prazer, com que deleite,
entrares em portos jamais antes vistos!
Em colónias fenícias deverás deter-te
para comprar mercadorias raras:
coral e madrepérola, âmbar e marfim,
e perfumes subtis de toda a espécie:
compra desses perfumes quanto possas
E vai ver as cidades do Egipto,
para aprenderes com os que sabem muito.

Terás sempre Ítaca no teu espírito,
que lá chegar é o teu destino último.
Mas não te apresses nunca na viagem.
É melhor que ela dure muitos anos,
que sejas velho já ao ancorar na ilha,
rico do que foi teu pelo caminho,
e sem esperar que Ítaca te dê riquezas.

Ítaca deu-te essa viagem esplêndida.
Sem Ítaca, não terias partido.
Mas Ítaca não tem mais nada para dar-te.

Por pobre que a descubras, Ítaca não te traiu.
Sábio como és agora, senhor de tanta experiência,
terás compreendido o sentido de Ítaca.

Constantino Cavafy, "90 e Mais Quatro Poemas"
(versão de Jorge de Sena)

Qualquer coisa disponham.

Aurora Silva

 
At 5:25 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Cara Aurora Silva, os seus comentários são muito bem vindos e estimulantes. Ao contrário de outros, cujo conteúdo só merece o nosso desprezo. Não responder a provocações é uma forma de resposta, não sei se me faço entender. E olhe que não há nada mais jocoso do que um galo “cuspideiro” a cacarejar sozinho..

 
At 5:38 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Aurora:se me explicares (em português suave) o que são "classic titrations" eu inda escrevo um poema.Podes falar tb sobre o "princípio da incerteza" ou outra coisa qualquer que eu depois tento aplicar isso à literatura e a gente faz um post a meias.A minha tese de mestrado foi muita a misturar ciência com linguagem, tenho que a passar pra português pra depois chapar aqui alguma coisa.
Rui Costa

 
At 6:34 da tarde, Anonymous Anónimo said...

e um facto que o dicionario extremamente util a vida toda.claro que muito disso e discutivel mas o que eu disse e irrefutavel.quanto a originalidade os meus reparos nao eram exactamente para si mas para o geral(com grosseeeirerriimo eu apenas quis enfatizar a falta de acuidade de forma obviamente ludica.nao era para si tambem porque interpretei como provocacao poetica a sua duvida que, mmesmo se for literal, nao ofende.atente no meu nick, percebera de imediato o meu tom enfatuado.o meu erro foi ter negligenciado o facto de nao estar a falar com os meus colegas da escola mais chegados,por exemplo.ter me esquecido que os modos de brincar da sua geracao tendem a ser muito diferentes e de que isto e apenas um texto logo uma data de informacao-o tom de voz por exemplo- muitas vezes decisiva da comunicacao normal esta ausente).nao sentenciei o valor de nada.concerteza que e mais literada que eu mas para este assunto nem e preciso se-lo muito.para que ter opinioes quando se pode ter a verdade?caro rui,se a tua intencao foi discordar le com atencao o meu outro texto e la encontraras essas posicoes.com a piada propositadamente a la batatoon(para evidenciar que nao pretendia ofender e porque nao cosigo fazer melhor)eu apenas quis salientar que e preciso notar-enfatizar as diferencas.ter um pouco de primata bem sei que todos temos(e do senso comum) mas como e obvio eu usei esse termo como sinonimo de simio(palavra que ficaria em desarmonia com a coloquialidade pre-adolescente de burro e camelo):a minha hiperbole:se a aurora nao distingui-se uma literatura de outra tambem dificilmente acharia diferenca entre ela, entre eu(reparem no"tal como eu") ou entre quem quer que fosse e um primata(partilhamos 99% dos genes nao e?).to be continued

 
At 1:50 da tarde, Anonymous Anónimo said...

estimado hm,essa primeira frase poderia ter sido minha ja que adorei os ultimos paragrafos das primeiras intervencoes da aurora,o que so nao mencionei(como creio ser meu costume:normalmente nos meus comentarios seja onde for elogio tanto como critico) porque ,ao contrario da critica, nao era generalizavel, a minha lentidao a teclar e enorme(o que me cansa e aborrece,obvio) e porque achei tudo mui inofensivo,no minimo.quao caricatamente paternalista esse conselho?embora preferisse que me apreciasses cago no teu desprezo(que podia e devia ter sido revelado antes, ou nao?).esse insulto parece me mesquinho,nao o mereco.que me respondam nao e o meu mobil portanto nao me sinto ridiculo tal como tu quando muitas mais vezes que eu cacarejas(e claro que nao e isto que acho dos teus posts ja que gosto mesmo quando discordo e quase sempre adoro,enfim,embora me desprezes continuo a admirar-te) sozinho...mais haveria a dizer mas ja me parece mais que suficiente

 
At 10:33 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Caro coisinho:

Eu tinha decidido não intervir mais aqui mas cá vai:
Desculpe não ter percebido o tom generalizado e irónico do seu comentário, mas que quer sou uma “gaja do norte”, apanhou-me num dia muito stressado, estava de pavio curto [como sou mulher posso dizer isto, sem 2ªs interpretações :)]!
De qualquer modo o que lá vai, já foi! E olhe se posso transmitir um bocadinho da minha experiência de vida (embora ainda me faltem uns valentes pares de anos p´ra bengala!). Eu tento arduamente só me aborrecer com coisas sérias e passo a listar: falta de comida, falta de afecto, falta de saúde and last but not the least…o estado Português

Fique bem,
Aurora Silva

 
At 7:02 da tarde, Blogger sandrapx said...

ola

 

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