13.11.05

2.

Vera Drake, do mais convincente realizador britânico contemporâneo. É, digo eu, o melhor filme de Leigh depois de Secrets & Lies (1996). As personagens de Mike Leigh são humaníssimas, são-nos tão familiares quanto os nossos vizinhos podem ser. Vera Drake conta a história comovente de uma mãe de família que acaba condenada a dois anos de prisão por ajudar, a troco de nada, mulheres a abortarem ilegalmente. Pode falar-se, redutoramente, de panfleto pró-aborto ou qualquer coisa do género. As assimetrias sociais estão presentes: quem pode pagar alto, faz tudo em condições e como manda a lei. Basta haver umas 150 libras no bolso que convençam um psiquiatra de danos psicológicos irremediáveis para a grávida que não deseja ser mãe ter todos os cuidados que merece. Quem não pode pagar alto, socorre-se do que tem à mão. É aqui que entra Vera Drake, uma mulher de família absolutamente irrepreensível cujo pecado é ser solidária. O drama de Vera Drake, primorosamente montado, mostra com eficácia todas as trágicas dimensões do problema do aborto. Não é panfletário, porque o realizador se limita a contar uma história cujos contornos morais caberá a cada um circunscrever. Mas é, sem dúvida alguma, um filme que assenta numa visão trágica do mundo: nem sempre a justiça é justa.
P.S.: imagem respigada aqui.