13.4.06

MARGARIDA-LIGHT

A literatura da Margarida é uma bosta e não é literatura. Dito isto, qual o interesse de se perder tempo a escrever um livro sobre a obra da rapariga?
Na minha opinião, a “Margarida” é um caso sociológico importante. E é importante porque enormemente revelador da “estrutura de afectos” da sociedade portuguesa em que vivemos. Tal como os Morangos com Açúcar, por exemplo. É certo que o João Pedro George não fez um estudo da “Margarida” do ponto de vista sociológico. Concentrou-se na “literatura” e fez, desde logo, um inventário de situações claras de escrita merdosa, repetida, bacoca, etc. Os Morangos com Açúcar também são, no sentido que estou aqui a (tentar) passar, um fenómeno sociológico “importante” (já devem ter percebido que este “importante” não tem nada que ver com “brilhante” ou “meritório”) e portanto passíveis de um estudo que poderia ser pertinente. Voltando à Margarida, foi o facto de ela vomitar livros que reflectem/movem/excitam/satisfazem a sociedade portuguesa actual que “a” tornou um caso sociológico merecedor de um “estudo” (vai entre aspas para manter aberto o “conceito”).

Não me parece nada mal que fique assente, escrito, documentado, “inventariado”, o tipo de literatura que “esta” é. Pelo contrário, acho bem. A “forma” do livro parece-me adequada ao “tema” que é tratado. Também acho que o livro estava condenado ao sucesso e que a providência cautelar que a autora pôs mostra bem a parvoeira da mulher e dos seus conselheiros.

Por fim, admito que não fiquei a gostar nem mais nem menos da obra da Margarida-light depois da leitura da versão do livro que apareceu no blogue “Esplanar”. Mas algumas pessoas literariamente menos exigentes do que eu poderão ter no “Couves e alforrecas…” uma boa pista para eventualmente questionarem algumas coisas e reforçarem o seu sentido crítico.

Quanto a mim, já sei: vou escrever um livro sobre o sucesso do livro “Couves e alforrecas: os segredos da escrita de Margarida Rebelo Pinto”. Yeeeees, editooooras?


Rui Costa

3 Comments:

At 10:15 da tarde, Blogger hmbf said...

Camarada Rui,

na sequência do que já partilhámos sobre este assunto via Messender, permito-me abrir esta caixa de comentários reafirmando algumas discordâncias:

1) A não-literatura da Margarida não é um caso sociológico mais importante que outros casos. O facto de ter merecido a atenção do crítico George só prova uma coisa: passou a ser literatura. Cito um dos axiomas do crítico George: «Sem a interferência da crítica, um livro pode existir mas não é literatura…» Sendo assim, os livros da Margarida passaram a sê-lo. Mesmo que me venham com a história da aprovação crítica, aquilo no que dá o livro do George é no reconhecimento de uma excepcionalidade merecedora da atenção que outros não merecem;

2) Para mim, o livro do crítico George só tem uma utilidade: promover financeiramente a editora e o autor do livro. Deste modo, parece-me pouco ético que ambos se tenham pendurado nas costas da Margarida de forma tão oportunista;

3) A sociedade portuguesa actual não deverá ser muito diferente de outras sociedades actuais, onde o lixo vende a rodos a os vomitórios são altamente frequentados. Tu já viveste uns anos numa dessas sociedades, uma sociedade que se bate há anos com o sucesso tremendo daquilo a que cá se passou a chamar, por apropriação, «literatura light»;

4) Em termos literários, não me parece que o sucesso da Margarida deva ser assim tão incomodativo. Sem fazer comparações, deixa-me atirar com a dúvida para o ar: alguém hoje conhece Albino Forjaz Sampaio ou leu as Palavras Cínicas, um dos livros mais vendidos de sempre da literatura portuguesa? O que eu achava interessante era um estudo do género acerca das santíssimas trindades que vão por aí sendo aclamadas como o supra-sumo da literatura portuguesa. Deus nos dê a todos saúde e tempo;

5) Dizem as más-línguas que o crítico George é agora o mais light dos críticos portugueses. Yeeeesss, leitores… Quem se quiser deixar ir na onda, que deixe. Eu prefiro ficar agarrado à corda das bóias!

Um grande abraço,

 
At 1:02 da manhã, Anonymous Anónimo said...

A omissão de aspas onde deviam existir pode induzir em erro quem por aqui passar. Quando afirmo «a não-literatura da Margarida» devia colocar a expressão não-literatura entre aspas. Isto, porque a considero tão literatura como outra qualquer. O que a distingue é o facto de ser má. Como dizia o mestre, uma má obra de arte não deixa de ser arte pelo simples facto de ser má. Para mais, deixo um parágrafo curioso, encontrado na net, de um tal Sérgio Pitol, escritor mexicano, nascido em 1933:

«La literatura light ha existido siempre. Al lado de Dickens, Balzac o Flaubert hubo otros escritores que hacían novelas dulzonas e irreales. Cada generación ha producido estos escritores, cuando yo era joven estaban A. J. Cronin, Vicky Baum y Lin Yu Tang, por ejemplo, quienes se dedicaban a lo suyo con una profesionalidad notable y no sentían competencia de Thomas Mann, de Virginia Wolf o de William Faulkner. Ni se molestaban porque no se hicieran tesis sobre ellos, ni por quedar fuera de las historias de la literatura. Tenían su público (ése que ahora ve telenovelas o lee la actual literatura light) ganaban mucho dinero y no creaban ningún conflicto en el mundo literario, los límites estaban muy claramente definidos y ningún escritor verdadero los hubiera insultado porque hubiera sido una villanía. Cada quien estaba en su feudo. Pero ahora las editoriales han hecho una combinación macabra: convertir a escritores que podrían ser serios, escritores de verdad, en escritores light. Y, en el camino contrario, algunos escritores —y escritoras- que nunca hubieran tenido ningún prestigio porque son muy malos y sólo se manejan en los límites de lo light, son impuestos como si fueran Lampedusa o Stendhal y hablan de James Joyce como de un consanguíneo. No mencionaré a ninguno por no incurrir en villanía con esas pobres almas enfermas de vanidad.»

 
At 3:50 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Ó Henriquinho!

Pós- pascoalices, ando aqui a fazer zapping nas insónias e digo-te que este teu comentário é excelente de coragem e frontalidade..e conhecimento.
Qjem não se lembra da "Colecção Azul"? ou da Corin Tellado? Chamava-se "romance cor-de-rosa". Agora que tem mais umas fodas explícitas e uns palavrões, o rosa escureceu...mas o conceito não anda longe.
Fiz há bastos anos uma cadeira de "Literatura Marginal". E desde o folhetim ao cordel,ao provérbio,aos slogans, aos grafitti, aos escritos das retretes públicas,tudo era
mencionado como uma espécie de para-literatura.
E já agora não se esqueçam do moderno género da epopeia, tipo:
A Bola, O Record e outras bostas.
ODEIO FUTEBOL E AQUILO EM QUE ELE TRANSFORMA AS PESSOAS. Poderosas bestas.



Mas, um bravo para ti, Riquito!


Aninhas

 

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