LIDOS OU RELIDOS EM 2008 (8)
Fala-se sobre guerra e suas mudanças, no sentido político e tecnológico.
1. A novidade da guerra dos Balcãs: o desaparecimento ou quase-desaparecimento da divisão entre conflitos internos e internacionais, com a distinção entre guerra e paz a ficar mais ténue. Estados atravessam fronteiras para se meterem nos conflitos internos de outros Estados, sem ter que haver declaração oficial de guerra.
Por outro lado, a alta tecnologia recuperou a distinção entre combatentes e não-combatentes. Isto contribui para o aligeiramento do recurso à destruição (com a desculpa de se evitar as mortes de civis e os danos colaterais relativos às “infra-estruturas que uma comunidade utiliza para viver e para produzir”).
2. Tendência para uma crescente presença dos privados nas guerras do futuro. Nos sectores do armamento, da alimentação, do vestuário das tropas. A intersecção entre guerras privadas e guerras dos Estados torna-se mais provável em zonas de forte desintegração estadual” (regresso aos “senhores da guerra”, que na Europa já não existiam desde o século XV e XVI). Este fenómeno é potenciado pela riqueza concentrada nas mãos dos privados (“pelo que sei, nenhum governo financiou o exército de libertação do Kosovo”). E “quanto menos os conflitos armados são estruturados, estatais, mais perigosos se tornam para as populações civis.”
3. Guerra “justa” ou “ética”? “Devemos lembrar-nos de que os Estados Unidos são, dentro de certos limites, um poder ideológico, que tem a sua origem, assim como a União Soviética, numa revolução, e sente por isso, como parte essencial da sua política externa, o imperativo de guiar o mundo segundo os seus princípios (...) No entanto, não me consigo lembrar de um único episódio em que os Estados Unidos tenham entrado em guerra exclusivamente para fazer o Bem, sem que estivessem em jogo interesses nacionais consideráveis.”
4. O autor fala da construção e reforço dos Estados-nação desde o século XVI até aos anos sessenta do século XX, sendo isto válido para todos os regimes. O Estado apropriou-se de informação, desenvolveu a actividade administrativa, alargou a gama de iniciativas e responsabilidades que assumiu, desarmou o povo, conferindo o monopólio dos meios de coerção às suas agências e conseguiu “a lealdade voluntária e a subordinação dos cidadãos aos seus Governos”, sendo a obediência voluntária parte da capacidade de mobilização do Estado.
A partir dos anos sessenta do século XX o Estado perdeu o monopólio dos meios coercivos. As armas ficaram mais disponíveis e nos cidadãos diminuiu a relutância em usá-las. Também tem diminuído a disponibilidade dos cidadãos para obedecer às leis do Estado. A ideologia neoliberal voltou-se contra o Estado e a tendência para o reforço do seu papel.
5. Hobsbawm é um defensor do Estado-Nação, necessário para garantir a redistribuição da riqueza, assunto com que as empresas da economia global não parecem muito preocupadas. “As suas funções [do Estado-nação] são menores do que antes, mas a redistributivas são mais importantes do que no passado.”
De Hobsbawm já havia sido publicado em Portugal “A Era dos Extremos”, sobre o “século breve”, o período que decorre entre a primeira guerra mundial e a queda do muro de Berlim.
Rui Costa
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