APRENDER A CONTAR #42
A MÁQUINA DO TEMPO
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Era varredor da cidade; uma manhã o outono veio sem contar; então o velho varredor, com pena das árvores despidas pelo vento, apanhou uma a uma as folhas caídas no chão e colocou-as uma a uma em cada galho, até que as mãos se lhe secaram de frio e a noite o cobriu para sempre.
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Mulheres na estrada:
― levam à cabeça cestos de vime carregados com flores, verduras, melões de água e a manhã das hortas levantada cedo e cheirando a hortelã-pimenta e a requeijão de ovelha mansa.
Cantam; e sobre os seus ombros magros como choupos um melro afia o ouro de seu bico.
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É recoveira dos dias e das noites; quando chega Setembro, os calcanhares abrem-se-lhe como duas romãs maduras rachadas pelo sol dos caminhos.
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Era um homem saído da treva com a cabeça coberta de lírios azuis e uma gota de orvalho pendurada na boca; tinha a idade dos astros e o seu nome estava escrito na coleira do cão que chorava sobre o silêncio da charneca. E assim como veio da treva, pela treva saiu, como um lírio esfolhando-se.
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E quando o homem pediu lume ao outro homem, a chama abriu-lhe o rosto e apagou-se como uma candeia dentro de uma casa cheia de medo.
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Dormia todas as noites num banco de jardim; uma madrugada veio um homem que lhe roubou a estrela de lixo com que ele penteava a neve dos cabelos daquela cabeça adormecida pela miséria do tempo.
Quando acordou já a manhã ia alta e aqueles que passavam não compreendiam a razão pela qual o homem segurava a cabeça entre as mãos e chorava como um fio de água correndo por uma parede abandonada.
Luís Pignatelli (1935-1993), Obra Poética 1953-1993, &etc., pp. 46-47, Maio de 1999.
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