12.10.05

INGLATERRA

Da primeira vez que fui a Londres estava a estudar em Espanha e numa rua de San Sebastian vi uma viagem muito barata e comprei-a. Fiquei no Bolsover Hotel, que parece depois foi transformado num hotel carote. No Bolsover Hotel conheci um marinheiro português, filho de um homem e uma mulher de negócios. Tinha estudado em Inglaterra mas aos 18 anos fartou-se e foi trabalhar nos barcos de uma empresa americana. Também lá conheci o Juan, um espanhol que era guarda-florestal e dizia que não conhecia ninguém (amigo, presume-se) que tivesse menos do que ele. Naquele tempo Inglatera não era (na minha cabeça) o que hoje é: um dos países mais racistas e classistas do mundo. Quando fui fazer o master em Leeds (2003) e às vezes tentava intervir, perguntavam-me: "Portugal, isso não é um país rural?" (bela rima). Mas quando tive as melhores notas do mestrado, incluindo os ingleses, até houve um professor que me pediu conselhos sobre a bibliografia para um trabalho que estava a fazer. O mérito é reconhecido e recompensado. Em Portugal a situação que descrevi seria praticamente impossível. Fazes qualquer coisa bem, anda cá que levas mais trabalho (raras excepções).

Não há países, como não há pessoas, perfeitos. Inglaterra é um país neo-colonialista (dir-me-ão que os que não são é porque não podem). Hoje, em vez de irem para a Índia com armas (e comboios, e algum sistema educativo) deixam que europeus, asiáticos, o mundo todo, venham a Inglaterra fazer cursos (os não- união europeus pagam propinas altíssimas), procurar trabalho (os menos qualificados fazem o trabalho que os ingleses não querem fazer; os qualificadíssimos são muito bem pagos, mas tendo os ingleses a vantagem de nada terem investido na sua deles formação).

É verdade que a Inglaterra tenta encontrar formas de integrar as minorias. Mas está sempre a fazer sapatos com solas de sabão. Há bons subsídios de doença, desemprego, etc. É um país em grande crescimento económico. Só que os não-ingleses são cidadãos de segunda, terceira, quarta, quinta (e só vão subindo na hierarquia à medida da sua capacidade para se inglesarem). Sociedade multicultural? Treta, meus amigos. Sabem que os ingleses ficaram muito admirados com os recentes atentados terroristas (é sempre uma coisa terrível, eu sei)? Sim, porque pensavam que as pessoas que os praticaram, que na sua maioria nasceram e viveram sempre em Inglaterra, gostavam de Inglaterra e se sentiam integrados. Não gostavam, odeiam; sabem que nunca se sentirão parte da sociedade inglesa. E por que é que os ingleses pensavam tal coisa? Porque a atitude dos ingleses é: OK, podem vir pra cá e abrir as vossas mercearias; ou trabalhar no JP Morgan e ganhar uma batelada de massa, desde que nós não tenhamos que saber como é que vocês são e vivem.
O multiculturalismo, que só faz sentido como genuíno interesse pela diferença, não se coaduna com meros esquemas formais de organização e gestão de sociedades burocráticas neo-colonialistas.
Desiludam-se, ó fascinados da neblina: Inglaterra, como país de gente no meio de gente, é um logro! E o pior de tudo: consentido.
Rui Costa

5 Comments:

At 12:08 da manhã, Blogger Unknown said...

Será uma descrição exclusiva do u.k? Ou antes dos países ditos ocidentais e civilizados? Não se poderia escrever o mesmo sobre madrid, paris, n. york ou até mesmo lisboa?!
Parabéns pelas insónias
PRG

 
At 3:38 da manhã, Blogger Unknown said...

eu afinal tinha motivos para desejar que essa ilha fosse insuflavel e houvesse algures no atlantico uma forma de a esvaziar. aqui no peru ha muito lixo por todo lado, mas pelo menos os ingleses que vemos estao so passagem :) un saludo andino, jorge y marta.

 
At 11:43 da manhã, Anonymous Anónimo said...

prg:e verdade, nao e exclusivo de Inglaterra.
loucomotivos:sempre a abrir que toda a terra e pouca.saludos!
Rui Costa

 
At 12:15 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Não sei se o que vou dizer faz sentido, ms também nós, por cá, começamos a ter essa atitude perante os que não são de cá e para cá vêm trabalhar. Pense-se nos ucranianos que por aí andam a trabalhar de obra em obra, ou de casa em casa fazendo serviços de limpeza, alguns deles vivendo na Rua( e que o nosso governo não consegue mandar de volta para os seus países porque não tem dinheiro para pagar a viagem, deixando-os a apodrecer nas ruas das nossas grandes cidades!)em condições miseráveis.
Não quero com isto defender o país em causa, até porque eles são uma mistura de vários povos que sempre se guerrearam entre si. O que quero dizer é que eles, como o resto do mundo(pense-se na frança e nos nossos milhares de imigrantes), colocam à parte quem para lá vai com o intuito de ganhar dinheiro porque isto é o mais natural e o mais fácil de ser feito. Quando no meio de 1000 amarelos, surge um azul, é óbvio que este vai ser olhado com desconfiança. Até porque a "culpa" é sempre do ser diferente...
Como ilha que é, o Reino Unido estará sempre afastado do resto da europa, economicamente e culturalmente, agora, que é uma terra de oportunidades, é. E que os valorosos serão sempre reconhecidos, isso também...quanto ao resto, nem sequer é importante pensar. Usa-se, abusa-se e volta-se a casa, onde a nossa alma se pode finalmente encontrar.

 
At 9:46 da tarde, Anonymous Anónimo said...

senhora das estrelas: eles sao uma mistura pequena demais, acho eu. a nossa (a portuguesa) e maior e ainda bem. sobretudo, nao nos devemos deixar fascinar com espalhafato de poder oco. e dizer, como o nobel ingles recente, o que deve ser dito. e fazer.
Rui Costa

 

Enviar um comentário

<< Home