10 000 ANOS DEPOIS ENTRE VÉNUS E MARTE

José Cid, O Caos.

Os bons fans de prog rock, e não só, sabem que José Cid fez em 1978 um álbum chamado "10 000 anos depois entre Vénus e Marte". Ao que parece (ver links mais abaixo), o álbum foi editado a contragosto pela Orfeu Records, que o achava pouco ou nada "comercial". A inclusão de um folheto de 6 páginas a cores com fotografias e letras encarecia demasiado o disco e o cantor acabou por abdicar do pagamento de "royalties". O LP não deve ter vendido quase nada em Portugal (e fora de Portugal só foi conhecido mais tarde) e José Cid não voltou a aventurar-se nestas lides. Foi pena.

Afinal, que disco é este? Bom, chamam-lhe prog rock (rock progressivo) e socorre-se da parafernália a que vulgar e geralmente "chamamos" sintetizadores: Mellotron, ARP Solina, Mini Moog. Coisas dos anos 70, aqui. A tender para o "sci-fi", como alguns dizem, notório desde logo no título do disco. Trata-se da epopeia de um homem e uma mulher que regressam à Terra 10 000 anos depois do seu apocalíptico final.

Vamos às músicas. Primeira: "O último dia na terra". Começo espacial calmo com percussão a entrar com batida seca e sintetizadores em toque de finados (riffs repetitivos como últimas respirações). Surge a voz depois, cantando em português "o planeta Terra já não pode mais viver...nunca mais verá o sol". Acaba em tom agonizante propício ao tema. "O caos", segunda música. Ritmo mais vivo e muito sintetizador. Potente marcação de baixo a fazer lembrar o heavy-metal dos inícios (décadas 70/80, "Deep Purple"). Guitarra em acorde calmo a fazer transição, solo breve sobre ritmo a abrir e quase-final com voz a dizer que "nem a própria ruína nos conseguiu manter acordados". Retoma-se o ritmo forte e cabem vários solos de guitarra e sintetizador. "Fuga para o espaço", a terceira do álbum, é a mais melancólica e a mais épica. Coro a abrir a música, com solo de guitarra em perfeita sintonia. José Cid, em tom de glam-rock, conta-nos as primeiras visões do espaço ("Marte é verde..."). Solo de piano "clássico". Retorno ao "coral" e excelente longo solo de guitarra, ainda piano e coro. Imaginar corvos psicadélicos em queda livre para o final da música. Depois ainda há "Mellotron, o planeta fantástico", oportunidade para explorar e homenagear um pouco mais a técnica ao dispor. "10 000 anos depois entre Vénus e Marte", os sons da Terra. Pássaros, golfinhos, a imaginação (longínqua e distorcida) disto tudo? Ou sou eu que gosto deste disco? O disco tem ainda "A partir do zero" e "Memos", que retoma a excelente parte instrumental de "Fuga para o espaço".

Para outros detalhes técnicos etc., ver aqui e aqui.

A editora californiana Art Sublime re-editou recentemente este disco em formato CD.

É ouvir, que é bom.

Rui Costa