20.8.05

Fragmento # 8 - Casa

Estava escuro. Entrámos no carro, tu a guiares sem regras, sem semáforos ou qualquer tipo de sinal de trânsito. Entendi porque te deram a carta tão tarde. Gritei para abrandares, lá voltaste ao normal. Chegámos, às escuras abriste a porta do teu mundo. O som da água que corre invadia o espaço da sala, deste-me a tua mão, abrindo a janela. Mostraste-me como a natureza entrava na tua casa, descrevendo-me com a língua como a vias e amavas. Pediste-me silêncio se não a água caía dos teus olhos. Na tua janela bebi a água que os teus olhos me deram. O riso a iluminar o mundo e os meus lábios a beijarem os teus olhos a sorrir. Perguntaste-me no meu corpo porque sempre te fiz rir. No meu corpo correu a água que corre na água e invadimos o espaço da sala. A tua mão em casa na minha. Entendi como amavas a natureza ao escreveres no meu corpo com a língua e a minha traduzia a escrita. Pediste-me que te contasse os meus sonhos, antes de adormeceres. Acordaste de um sonho onde estávamos os dois em silêncio na tua sala, a escrever, lá fora havia um barulho ensurdecedor, estavam políticos que tu odiavas, a multidão da qual fugíamos. Tremias quando te agarrei e abracei como podia. Eu não temia, a minha mão firme em casa na tua. Querias para sempre, mas respondi-te que isso é um romance já escrito. Contei-te que sonhava com o mar, que ele se tornava cada vez mais revolto, com ondas enormes e que tinha de fugir.
Maria João