25.9.06

HÁBITOS

Cada vez mais parecidos uns com os outros, os fins-de-semana regem-se pelos hábitos. A chuva que começa a cair, as folhas entretanto espalhadas pelo chão, a música de Tom Waits, a monotonia dos dias. Uma vez escrevi sobre os hábitos: os hábitos são parte essencial da vida, sem eles dificilmente conseguiríamos sobreviver. Um dos hábitos que mais me agrada preservar acontece ao fim-de-semana. Pouco antes da hora de almoço, saio de casa, dirijo-me a uma papelaria, registo o boletim do totoloto e compro alguns jornais. Só muito excepcionalmente compro jornais durante a semana. Depois, atravesso o mercado diário, bem no centro da cidade, e saboreio os aromas da fruta fresca e dos legumes. Desço até à pastelaria Machado ou à cervejaria Camaroeiro, procuro uma mesa num dos cantos do estabelecimento, sento-me e peço, por esta mesma ordem, uma bifana, uma cerveja preta, um café e uma água com gás. Enquanto espero pela bifana, folheio os jornais e leio um ou outro artigo de opinião, conforme o tempo que a dita demore a pousar à minha frente. É raro não preferir a bifana ao que estava a ler, pelo que interrompo quase sempre a leitura quando a bifana chega à mesa. Já a carne se me acomoda no estômago e passo aos suplementos. Leio algumas recensões a livros, notícias de discos recentes, críticas a filmes já vistos - nunca as leio antes de ver os filmes - e um qualquer artigo mais aprofundado que me prenda a atenção. Aí se encerram as minhas leituras da imprensa escrita, porque depois os jornais caem esquecidos num saco de plástico lançado para um canto qualquer lá de casa. Não é raro vir a descobrir alguns artigos de interesse, quando, antes de votar o papel à reciclagem, dou uma última vista de olhos pelas revistas e suplementos. Rasgo esses artigos e guardo-os num caixote. O caixote do esquecimento. O resto é lixo que não me comove. Os hábitos mudaram. Não muito, mas mudaram. Já não como bifanas, já não leio críticas a filmes, desinteressei-me dos discos recentes, raramento frequento certos lugares.

7 Comments:

At 6:36 da tarde, Blogger Fábio said...

Henrique, concordo com o que dizes sobre os hábitos, e, curiosamente, comungo de muitos contigo.

Com uma pequena inflexão nas tuas palavras concordo incondicionalmente (passe o paradoxo) com o que dizes sobre o Tom Waits - O 2º melhor songwriter (depois do Nick Cave). E a coincidência é tanta que passei a semana passada a ouvir o "filipino Box Spring Hog" ( mas também o "big in Japan" e o "What's he building").

Por outro lado escolho uma música com relativa facilidade :"Hoist that rag", do album "Real gone". Provavelmente a música que mais me moveu (em vários sentidos) em 2004.

Um abraço.

É sempre um prazer ler-te

 
At 9:20 da tarde, Blogger Fábio said...

Não podia de deixar de já ter visto.. não me lembro já do motivo pelo qual não sinalizei a minha passagem por lá. Mas acontece muitas vezes não haver mais nada para dizer a partir dos teus textos.

Desde que descobri o teu blog que vou fazendo uma lenta arqueologia, e o nick cave não me passaria ao lado. :)

Abraço

 
At 1:21 da manhã, Blogger dama said...

Pois eu continuo a dizer que o Waits é o único cantautor pelo qual, quando se dignar a vir cantar a Portugal (e continuo a confiar no Seu Advento), serei capaz de esperar noites a fio na bicha das bilheteiras. O Cave tb curto e já o ouvi aqui ao vivo, mas está a léguas... Há discos pedidos? Então que venha a Valsa da Matilde.

 
At 1:32 da manhã, Blogger Fábio said...

Esperarei nas filas pelo Sr.Waits, mas durante a espera levo um mp3 recheado de Cave... :)

 
At 10:56 da manhã, Blogger manuel a. domingos said...

o tom waits é um senhor!!!

 
At 2:11 da tarde, Blogger Fábio said...

Sim shenhor. O Sr Waits é um grande senhor.
Convido-vos a vê-lo no "Tigre e a Neve",de Roberto Begninni. Com uma (bonita) canção original, que se bem me lembro se chama "Tou can't never hold back spring"

 
At 10:34 da tarde, Blogger Fábio said...

"You can´t never hold back spring

 

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