POP MUSIC
Escrever amargura, com ou sem estilo, fica sempre amargo. É como pôr sal a mais na sopa, quando o preferível seria deixá-la insonsa. Quem a meter à boca, que a tempere com a quantidade de sal desejada. Assim escrever amargura. Mesmo quando sabemos de cor a cor das camisas, as costuras das calças desbotadas, compradas já como se fossem velhas, mesmo quando vestimos de novo roupagens que parecem velhas, roupagens que, compradas em segunda mão, ninguém notaria não serem em primeira. Se pudéssemos pôr sal no sol, não tardaríamos na noite escura. Não podemos. Daí que andemos para aqui e para acolá, achados no labirinto das imagens, muito orgulhosos de termos achado a metáfora perfeita para a nossa canção preferida. Lembrar-te-ás da tua canção preferida daqui a, vá lá, dez anos? Aposto que, se te lembrares, não te lembrarás que um dia, há dez anos, te colocaste esta mesma questão. Porque é tudo muito relativo quando os artigos precedem os hífenes, porque é tudo muito verbal quando os tempos precedem os verbos, porque é tudo muito a piada perfeita na ponta do dedo indicador, porque é tudo muito desunhado, mesmo que, para disfarçar, haja quem passe verniz pelo sabugo. Ninguém te exige que sejas claro, que digas sinceramente com sinceridade, que escrevas como quem fala. Não há isso de escrever como quem fala. Quem escreve como quem fala limita-se a falar, não escreve. Ninguém te exige nada. Apenas te sugerem mais cuidado no condimento, respeito pela cardiologia dos fracos, o gosto está-nos no goto, pedimos-te espaço para a respiração. Caso contrário, embucharemos. E quem pode aturar um povo embuchado? Andamos tão dias na claustrofobia. Deixa-nos, pelo menos, uma ou duas sementes à mão, para que, depois, possamos plantar ideias nas palmas, ideias que florescerão dando frutos para a terra, frutos que pisaremos como se fossem livros espalhados pelos quartos, livros rasgados pelas mãos das crianças, já que para elas outro objectivo não há-de ter a capa de um livro senão o de ser rasgada.
3 Comments:
é isso mesmo. é isso tudo
sim, acho que a música dispensa muito as conversas (escritas ou faladas) não as palavras que até podem dar boas conversas, enfim, não é fácil, eu tenho dificuldades e até tenho uma música que não sendo da minha vida, quando a oiço é como se fosse a primeira vez.
Fico contente por me ter feito compreender. :)
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