A VORAGEM DO TEMPO
O desaparecimento de Paul Newman fez-me pensar nas musas da adolescência, actrizes com lugar reservado na memória por razões que não têm que ver necessariamente com a qualidade dos filmes em que participaram. Tem muito mais que ver com a qualidade das suas performances individuais. Lembrei-me da Kim Basinger de Nine 1/2 Weeks (1986), filme que vi no cinema de Rio Maior, sentado ao lado de uma mãe levada por engano, numa sala onde era frequente ouvirem-se bocas foleiras a cada cena mais acalorada. Curiosamente não me recordo de ter escutado uma única boca, foleira ou não, durante a exibição daquele filme. Outra moçoila de quem me lembrei foi a "desaparecida" Carré Otis de Wild Orchid (1990), mais uma vez com Mickey Rourke no papel de homem de sorte. Maria Schneider foi uma das tais que me proporcionou mementos de fantasiosa felicidade quando a vi contracenar com Marlon Brando em Ultimo tango a Parigi (1972). Sharon Stone é um lugar comum nos rapazes da minha geração, não só pela flexibilidade plástica demonstrada em Basic Instinct (1992) mas também pelo mais desconhecido, ainda que não menos entusiasmante, Sangre y arena (1989). Já não sou do tempo de Brigitte Bardot e Sophia Loren, mas gosto muito. Também não desgostei de Jane Birkin em Je t'aime moi non plus (1976), do genial Serge Gainsbourg (escandaloso, o duelo filmado com a filha Charlotte no filme Charlotte for Ever (1986)). Meg Ryan e Elisabeth Shue são dois fetiches muito cá de casa por razões que uma réstia de vergonha na cara me impede de revelar. Mas esta conversa toda serve apenas para recordar a esquecida Kathleen Turner, cujo tom de voz me colava ao ecrã como… sei lá como! Quem se lembrar dela em Crimes of Passion (1984) sabe do que estou a falar, principalmente no que concerne ao tom de voz. Aliás, nesse filme entrava um outro actor injustamente esquecido de seu nome Anthony Perkins. China Blue, metade da personagem interpretada por Kathleen, é um falso mito que seria pertinente recordar neste tempo de putas finas e doutores Jekyll. Veio-me ainda à memória Giulia e Giulia (1987), desta feita com o cantor Sting no papel de homem de sorte, onde Kathleen Turner encarnava uma Júlia assaltada, mais uma vez, embora involuntariamente, pela dupla personalidade. É a imagem de Kathleen Turner, esse ícone sexual da minha adolescência, que se reproduz ao alto. Dir-me-ão que o tempo não perdoa. Tudo dependerá das memórias que acompanharem a inexorável voragem do tempo.
8 Comments:
Tantos actores esquecidos, que infelizmente são mais lembrados nas suas mortes...
Belo texto
Henrique, a tua adolescência corresponde à minha infância. Deve ser por isso que não te ocorreu a Laura Dern, de "Wild at Heart". Ou então por te antecipares a mim na busca pelos seus "retratos enquanto enquanto madura" e te enteiraes que virou feia como os cornos...:(((
Longa vida para a Laura (Dern) de "Wild at Heart"!
eh pá! a Kathleen Turner... também me lembro muito dela. quanto às outras, nunca fui muito à bola com a Basinger, a Otis, a Schneider ou a Shue, e tenho um odiozito de estimação pela Meg Ryan (também pela Meryl Streep, mas por razões diferentes). a Bardot sim, mas nas francesas sempre fui incondicional da Fanny Ardent... a Loren sempre, como também a Sharon Stone, mas... a Kathleen Turner, ai a Kathleen Turner...
correcção: é claro que é Fanny Ardant e não Ardent, mas a semelhança com Ardente leva-me quase sempre a cometer este erro. :)
A questão do envelhecimento e/ou decrepitude física, atravessa, embora lateralmente, este e o último post, mais alguns comentários.
Mais uma vez, uma generalização, (a velhice) simplifica em demasia.
Os actores ou os bailarinos por ex., convivem dificilmente com a idade, porque o próprio corpo (visível) é o "suporte" da sua arte; o instrumento que a comunica ao público. Mas, o mesmo não se passa com os escritores ou os músicos (compositores ou intérpretes). Horowitz, octagenário, ainda se apresentava em Concerto. O prof. Agostinho da Silva, da mesma idade apresentou-se na RTP, com as suas célebres "Conversas "(?); Cesariny ainda era o que era, com essa idade; e o Herberto, já vai muito adiantado nos setentas...
Ainda há poucos meses, veio à Casa da Música apresentar-se em Concerto, a pianista Nella Maïssa, com 92 anos!
Óbvio que a idade traz degenerescência celular e patologias severas. Mas, não é muito mais interessante um velho ou velha, luminoso e sábio que um jovem azeiteiro e trinca-espinhas, que só parasita o mundo?
Newman é um ícone, como actor, porque não perdeu a enorme qualidade e dignidade, mesmo nos papéis e realizações da maturidade tardia.
O 1.º filme que vi com ele, foi "Gata em Telhado de Zinco Quente", com a Elizabeth Taylor. Entretanto já tinha lido a peça do Tenesse Williams, pois nessa época, faziam-se muitas edições livreiras de peças de teatro, porque a censura salazarista, não deixava encenar nada sem cortes. O teatro era lido e não representado...
Gostei muito do com. do Luís, um expert, mesmo, e deste post, em que o Henrique demonstra bem a importância da memória e das nossas aderências, repulsas ou indiferenças pessoais,preconceitos, que têm a ver com o nosso percurso,nas preferências evocativas da face duma figura marcante.
Henrique, lembro-me da Kathleen Turner em "Noites Escaldantes", com um sortudo e assarapantado William Hurt: a cena à janela, excelente.
Mas os sex-symbols não existem, na realidade. São imagens, que nunca chegam a morrer. Sem culpa.
Os símbolos (não só os "sex"), não morrem nem envelhecem, Por ex: a cruz ou o crescente ou a estrela de David; tal como o Che, a Marilyn ou a Senhora de Fátima. Por isso é indiferente postar num blogue a evocação do auge de um actor ou a políticamente correcta (os velhadas também são belos...) foto dos seus derradeiros anos.
Mas eu só tornei aqui, para lembrar que o Manoel de Oliveira, fez este ano, 100, de VIDA.
Correcção de datas:
Afinal o homem (Manoel de Oliveira) é Sagitário.
Faz os 100 no próximo dia 12 de Dezembro.
Em compensação a Nella Maissa, pianista, nasceu em 1914,em Turim, logo tem 94 anos e não 92.
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