DINIS MACHADO (1930 -2008)
Com as tuas palavras, numa noite de Verão, num bar de província, expliquei como se fazia um minete. De como era importante morder as virilhas antes de atacar o berlinde, e fazer deslizar as mãos entre os lençóis e as nádegas, de modo a que o peso do corpo se sinta amparado e a ansiedade se torne espectadora do desejo. Com as tuas palavras desloquei lentamente as mãos até aos lábios e abri-lhe a boca, prescindi dos adjectivos, fiz a língua passar lentamente pelas bordas inchadas e húmidas, muito lenta lentamente, como a brisa a deslizar no sal, até chegar ao ponto enigmático, à bússola perdida, de um coração batendo desenfreadamente pelo corpo todo. E expliquei-lhe, seguindo os teus ensinamentos, que estar na cama é aceitar o limiar da loucura, e que estar na cama é estar no chão porque assim se evitam encontros inesperados, e que evitar encontros inesperados é penetrar suavemente na flor. «As flores nascem do estrume, diz Molero» e eu acredito. Como não? E é no estrume que a minha língua anda às voltas, contornando o clítoris num movimento circular, como se a língua fosse um dedo a desenhar círculos num espelho apagado pelo vapor da água. Mas há o segredo de, quando menos se espera, um gesto violento travar a monotonia. Chupa o botão entesado até àquele ponto em que a dor não apaga o prazer, antes pelo contrário. Porque depois dessa dor, todo o prazer vem ampliado. E vem-se para a boca e a gente bebe aquele vir-se como se estivesse a beber um elixir acabado de ser descoberto. Agora que morreste, agora que te escrevo o necrológico, confesso: foram as tuas palavras quem, pela primeira vez, me trouxe à boca o suco divinal que a língua almeja quando se aplica com sabedoria e sem qualquer tipo de repulsa na pura provocação do prazer. «Flores para ti que és meu irmão, flores para ti porque te amo e porque todos juntos havemos de fazer um mundo melhor»:
Estou sentado à beira-mar, olhando o mar sem o ver. Voa no meu pensamento a dança e a contradança de lembrar e de esquecer. Não sei se vou lembrar. Não sei se vou esquecer. E enquanto sei e não sei, estou sentado à beira-mar, olhando o mar sem o ver. Na tal dança-contradança de pensar e não pensar, pressinto que vou sentir lágrimas no meu olhar. E enquanto sinto e não sinto atiro pedras ao mar.
Estou sentado à beira-mar, olhando o mar sem o ver. Voa no meu pensamento a dança e a contradança de lembrar e de esquecer. Não sei se vou lembrar. Não sei se vou esquecer. E enquanto sei e não sei, estou sentado à beira-mar, olhando o mar sem o ver. Na tal dança-contradança de pensar e não pensar, pressinto que vou sentir lágrimas no meu olhar. E enquanto sinto e não sinto atiro pedras ao mar.
A partir e com Dinis Machado, O que diz Molero, Edições Temas da Actualidade, 1995.
2 Comments:
belo e comovente e merecido, de onde ele espreitar te enviará um sorriso, henrique
Obrigado blimunda. À saúde do Machado!
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