9.1.06

A chapada

Tira a mão do queixo, não penses mais nisso. Há coisas que parecem não ter nada que ver umas com as outras. E no entanto… No último O Eixo do Mal, programa da SIC Notícias que João Pedro George já descreveu com elevado sentido crítico, há um momento de relance que diz muito do país aburguesado em que vivemos. Transmitidas, em jeito de graça, assim tipo Portugal no seu melhor, as imagens de um gordo a comer com uma chapada na cara em pleno aeroporto nacional. Já toda a gente sabe do que se tratava, mas a mim não me importa discutir aqui os contornos “desportivos” que motivaram aquelas "imagens de ris(c)o". Passadas as imagens, damos com a fronha de Clara Ferreira Alves num grande plano com sorriso de orelha a orelha. A cultíssima cronista não comenta, passa à frente, interessa-lhe mais discutir, que é como quem diz farpar, as negociatas do governo a propósito da Berardo Collection. Ainda se ouve um comentário despropositado, o que mais se ouve no dito programa, do ex-Barnabé Daniel Oliveira. Mais nada. Calhou que ontem desse com este texto sobre os trogloditas das claques de futebol (e aqui sou transversal e multidisciplinar: à merda com eles todos) e me pusesse a pensar de mim para comigo: e se tivesse sido a douta Clara Ferreira Alves a comer uma chapada em pleno aeroporto nacional, com as câmaras televisivas todas apontadas na direcção da sua lustrosa penca e a bófia a meio metro, de braços cruzados, sem qualquer reacção? Sim, pergunto-me, e se tivesse sido um leitor entediado da magnânime Clara Ferreira Alves a pregar-lhe um valente par de estalos pelas baboseiras de trazer a tiracolo que ela vai publicando nas últimas páginas duma revista dum conceituado semanário português? Qual seria a reacção desta gente? O mesmo sorriso de orelha a orelha que a chapada na fronha do gordo lhes mereceu? Talvez não. Provavelmente seríamos brindados com mais uma crónica da romancista-que-ainda-não-é sobre a falta de civismo dos portugueses, sobre a falta de cultura dos portugueses, sobre a desgraçada sina de brutamontes dos portugueses, sobre o “burgessismo” elementar dos portugueses, sobre a impunidade com que os abrutalhados portugueses são brindados pela putativa justiça nacional, sobre o sobre do sobre sobre, etc. Assim vamos andando, gordos, de arrotos travados no bucho, embuchados, com bochechas bem tratadas à cata de chapadas sem resposta. Um cidadão português, seja lá por que razão, gramou com uma bofetada de um jagunço, repito: de um JAGUNÇO, em pleno aeroporto nacional. Os inteligentes portugueses sorriem de orelha a orelha. Pode ser que para a próxima lhes calhe a eles o peso da incúria sobre as trombas. Havemos todos de estar por cá para ver e escrever posts sobre isso.

3 Comments:

At 12:02 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Sobre os trogloditas também sou transversal e multidisciplinar mas não os mando sequer à merda. Antes, pergunto-me se não se pode simplesmente exterminá-los.

P.S. Fiquei sem saldo. Depois conversamos. Apita na quarta (ou quando quiseres).

 
At 10:27 da manhã, Blogger Vítor Leal Barros said...

e é isto Portugal... palavras para quê... (gente que se diz culta e educada deveria mostrar mais tolerância e bom senso em algumas situações... é por estas e por outras que depois a malta se chateia à séria)... não vi o programa, mas ler o teu post foi suficiente para compor o quadro... parece que sinto o cinismo das expressões (para quem volta e meia assiste ao programa não é difícil de imaginar)

 
At 8:41 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Essa gaja mete-me nojo. E nem o facto de ela ter a fama de especialista me levaria a deixá-la aproximar-se de mim com a boca...

 

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