4.7.06

TONHÃO, CORAÇÃO-DE-BALIZA

Sapato Tonhão
Amador da oratória aprendida nos jornais da bola, o jogador de futebol desenvolveu um discurso hermético sobre cuja compreensão hoje me proponho arriscar alguns contributos.
Perguntam ao Tonhão:
- Tonhão, um adversário difícil, este Rio Ave?
E o Tonhão responde:
- Bem, o Tonhão tem consciência da dificuldade mas o jogo tem 90 minutos e a bola é redonda.

Um espanto de análise e profundidade visionária. Senão vejamos: "o Tonhão tem consciência". Admirável. Ninguém se lembraria de dizer tal coisa. Muito menos alguém que se trata na terceira pessoa, certamente porque um dia lhe apontaram para o espelho defronte dizendo: "Vê, Tonhão: aquele és tu".

E o Tonhão viu. E não gostou. E partiu o senhor do espelho espetando quatrocentos pedaços de vidro aleatórios na cara do ainda e sempre Tonhão.

E mais soberbo ainda se pudesse constatar, caro leitor, a rapidez de projecção verbal (22,4 segundos desde a pergunta até ao primeiro hum...), a desenvoltura da expressão corporal (mãozinha direita a coçar os tomates aos 3 segundos) e, enfim, tudo aquilo que não conseguimos ainda, hum, captar.

"O jogo tem 90 minutos": a válvula de escape do sistema tendencialmente perfeito. Se o Tonhão ganhar o jogo ninguém vai ver o que é que ele andou a dizer. O que as pessoas querem saber é como é que ele marcou o golo que elas viram quarenta vezes repetido na televisão em cerca de trinta ângulos e velocidades diferentes. Se, por outro lado, o Tonhão perder o jogo e algum jornalista for vasculhar entrevistas anteriores, e reclamar que afinal o Tonhão não acertou - na vitória -, o Tonhão responderá se quiser: "pois não, mas o jogo também não teve 90 minutos, e aí é que estava o mistério do fim da frase. Não percebeu?"

Mas que não se salte logo prós penalties: "a bola é redonda". Enigmático não chega. Chovem-me sapos por dentro da cabeça. Ora reparem, também viram?, repararam como ele carregou a cara, como se sofresse um pequeno choque eléctrico mas em câmara lenta e da frente para trás, um esforço ao mesmo tempo de respiração quando entre "a bola é" e "redonda" parece que vai parir o universo e fecha os olhos como se os fosse engolir? Claro, só pode ser um sinal secreto de início de comunicação extra-sensorial, um fenómeno paranormal, superior, imperceptível ao leigo distraído. Tonhão é um exemplo. Um discreto exemplo que não gosta de dar nas vistas (sobretudo dos espelhos). O que tu quiseste, Tonhão, foi dizer a toda a gente que os espelhos são maus. Foi isso que nos tentaste transmitir quando escangalhaste a cara daquela maneira enquanto falavas. Obrigado!

E se a bola é redonda, o écran do meu computador é rectangular. Como o écran da tua vida, Tonhão, o campo desse jogo onde nos ensinas a sonhar. Porque o teu discurso contagia e um mais um somos dois. Ou muitos mais se for preciso. E mainada.

Rui Costa

4 Comments:

At 5:41 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Hum... a par do homem de palha, ainda heide saber o que é essa tal do "o homem faz o meio".
duuuhhhh :)

brad

 
At 5:54 da tarde, Anonymous Anónimo said...

"VÊNUS 1 X 1 SÃO RAIMUNDO – Em Abaetetuba, em outro jogo pela sexta rodada do Parazão, o Vênus empatou em 1 a 1 com o São Raimundo, de Santarém, na noite deste sábado. Tonhão fez Vênus 1 a 0, aos 25 minutos do segundo tempo. Já no final da partida, aos 47 minutos, Jair, cobrando pênalti, fez São Raimundo 1 a 1"

in www.radioclubedopara.com.br/i_clubenews.asp?pagina=4
:::))))

 
At 11:30 da tarde, Blogger Unknown said...

um tanto ou quanto humor à 'pastéis de nata'!!! só falta o boné. nem tudo o que passa na RTP2 é bom.

 
At 11:31 da manhã, Anonymous Anónimo said...

loucomotiva: é verdade. mas é que eu gosto de experimentar tudo e o risco é este.
Rui Costa

 

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