13.10.06

Sentidos ocultos

«O "respeitinho" democrático, num certo sentido, é bem pior do que o "a bem da nação" de Salazar.» – diz João Gonçalves. Num certo sentido, poder afirmá-lo é incomensuravelmente melhor do que não poder. O meu paizinho, que andou pelas Áfricas enganado, ensinou-me muito cedo que o maior vício da democracia é a nostalgia do poder. Essa nostalgia do poder, num certo sentido, manifesta-se de múltiplas maneiras. Por exemplo, na saudade de um certo heroísmo excêntrico. O problema de quem hoje faz opinião, seja pelos circuitos vulgares, seja por outros menos insuspeitos, é o malogro. Realmente, não deixa de meter uma certa pena que no meio de tanto escarcéu opinativo o mundo siga de costas voltado para o herói de boca. Já ninguém quer saber de nada que não seja o pilim ao fim do mês para pagar contas e curtir feriados. Em Setembro anseia-se por Agosto, em Agosto retarda-se o Setembro. A Primavera é já só uma das quatro estações, mesmo que os nostálgicos do poder da palavra teimem em não percebê-lo. E tudo seria tão fácil se seguíssemos o hino: às armas, às armas, contra o respeitinho marchar, marchar. Mas não, dedicamo-nos a posts e pouco mais. Nós somos a confirmação do “respeitinho” democrático, para aqui a opinar sobre tudo e sobre nada como se isso valesse… “a bem da nação”.