AVISO AOS NÁUFRAGOS
Esta página, por exemplo
não nasceu para ser lida.
Nasceu para ler pálida,
um mero plágio da Ilíada,
alguma coisa que cala,
folha que volta pró galho,
muito depois de caída.
Nasceu para ser praia,
quem sabe Andrômeda, Antártida,
Himalaia, sílaba sentida,
nasceu para ser última
a que não nasceu ainda.
Palavras trazidas de longe
pelas águas do Nilo,
um dia, esta página, papiro,
vai ter que ser traduzida,
para o símbolo, para o sânscrito,
para todos os dialetos da Índia,
vai ter que dizer bom dia
ao que só se diz ao pé do ouvido,
vai ter que ser a brusca pedra
onde alguém deixou cair o vidro.
Não é assim que é a vida?
não nasceu para ser lida.
Nasceu para ler pálida,
um mero plágio da Ilíada,
alguma coisa que cala,
folha que volta pró galho,
muito depois de caída.
Nasceu para ser praia,
quem sabe Andrômeda, Antártida,
Himalaia, sílaba sentida,
nasceu para ser última
a que não nasceu ainda.
Palavras trazidas de longe
pelas águas do Nilo,
um dia, esta página, papiro,
vai ter que ser traduzida,
para o símbolo, para o sânscrito,
para todos os dialetos da Índia,
vai ter que dizer bom dia
ao que só se diz ao pé do ouvido,
vai ter que ser a brusca pedra
onde alguém deixou cair o vidro.
Não é assim que é a vida?
Paulo Leminski nasceu em Curitiba, Paraná, no dia 24 de Agosto de 1944. Publicou os primeiros poemas em 1964, na revista Invenção – porta-voz da poesia concreta paulista. Publicista, músico e letrista, Leminski foi ainda um multifacetado tradutor de Alfred Jarry, James Joyce, Lawrence Ferlinghetti, John Lennon, Petrônio, Samuel Becktett e Yukio Mishima. Estudou a língua e cultura japonesas, tendo publicado uma biografia de Bashô. Faleceu no dia 7 de Junho de 1989.
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