4.1.08

PISTOLA & EPÍSTOLA AOS PAGÃOS

(trez trezenas per versus)

eu não escrevo, reescrevo
no que a vida me conforma
nem escrevi, subscrevi
nas quatro folhas do trevo
- voz dum cânone sem norma –
tudo aquilo que comi
com faca, garfo, colher
mãos e boca e pilili
no que vai da tulha à dorna
e passa pela mulher
(preciosa vitualha)
mais o mais a que me atrevo
sorrisófago & canalha…

não há artes, há é vida
cheia de bicho bichante
uns, no prótido caroço
outros, no insecticida
sobre a casca rutilante
e os mais no miolo doce
dos lípidos e glucídeos
neste perpétuo almoço
de lagarta ruminante…
Irmãos! Ó post-hominídeos
maldito quem arme ao charme
nesta escolha suicida
entre a farmácia e a farm

nem há poetas, há o nexo
da vitamina e o sais-entras
dos minerais importantes…
E se, a vox-xelências, vexo
[…ó horror-tallon (mientras
o hífen dos hinfestantes
vai comendo, tanto o novo
como no excretado antes)
é bem aqui que tu entras
como um cu-lombo a pôr ovo…]
viva o cérebro dos músculos
viva a beatidão do sexo
vivam os versos exdrúxulos!


93/10/07 santiago

João Pedro Grabato Dias

João Pedro Grabato Dias é um dos heterónimos do pintor e escultor António Quadros. Professor da Faculdade de Arquitectura do Porto, António Augusto Melo de Lucena e Quadros nasceu em Viseu no ano de 1933. Diplomou-se em pintura na Escola de Belas Artes de Lisboa. Estudou gravura e pintura na Escola de Belas Artes de Paris e, no início dos anos sessenta, partiu para Moçambique. Foi em Moçambique que o heterónimo João Pedro Grabato Dias nasceu. Estreou-se em livro em 1970 com 40 e Tal Sonetos de Amor e Circunstância e Uma Canção Desesperada. Foi co-editor e co-director, com Rui Knopfli, dos cadernos de poesia Caliban (1971-1972). Regressado a Portugal na década de oitenta, António Quadros doutorou-se em Arquitectura, pela Escola Superior de Belas Artes do Porto. Faleceu na sua cidade natal em 1994. O poema que aqui reproduzimos apareceu no n.º 8 dos Cadernos de Poesia Hífen.