INÉDITOS DE JORGE AGUIAR OLIVEIRA #37
P DE FACA E TACHO
O pregão é pobre,
o manjerico enfezado
e a quadra é frouxa.
A sardinha e o cansaço
vivem congelados
transando nas ruelas
da Mouraria. Amanhã,
desfila a Marcha
pela Avenida repleta
de saltimbancos
do contrato a prazo
e dos trolhas
do sofrimento avulso.
O xaile da varina e
o avental da Rosa
do Mercado da Ribeira
hão-de ir parar à vitrina
do museu, onde haverá
uma foto documental
da escama do peixe
com legenda para
nenhuma criança pensar
ser a unha duma pega
travesti perdida no banco
de trás dum automóvel
à beira Tejo. Na noite
das Marchas, foliões
entre os canteiros,
fingem ver os marchantes
com as dores no corno,
cotovelo e no cu, por
pichas safadas e vadias,
que fazem duma foda,
um tempo de namoro
e dizem ficar noivos
de Santo António.
Fios dental cheirosos
a bacalhau no nariz
do polícia à paisana
e duas pernas ponteiros
de relógio que não param
de atiçar a procura
duma presa. Desfilam
os asnos, trauteando
notas vazias, engolindo
sapos a mando chantagista
dum chefe e mastigam
pizzas & hambúrgueres
ao balcão mal cheiroso
da moldada miséria.
Também andam por ali,
para serem vistos
pelos que lhes dão um
empregozito e os do voto.
Até os que travam lutas
na defesa da truta
e da libelinha, desfilam
num telejornal em busca
de protagonismo para
ganharem o troféu: o tacho.
Fatigado por não esquecer
o remorso de não ter
apanhado a onda do teu
olhar cheio de desejo e
a rejeitei, levo as mãos
aos bolsos, aspiro
o perfume dos manjericos
e entro pelas ruelas
da Mouraria boémia
para declamar um poema
ao primeiro que venha
socar a minha solidão.
Jorge Aguiar Oliveira
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