"HÁ UMA GERAÇÃO DE POETAS PORTUGUESES DO SÉC. XXI?"
A um título interrogativo, o Luís Filipe Cristóvão responde com uma interrogação: Deve um poeta indignar-se por haver um enorme silêncio à sua volta ou deve aproveitar para continuar a escrever? Faz muito bem... em questionar-se. Revela aquela honestidade que os antigos sintetizavam no dito quem não se sente não é filho de boa gente. E por que se sente o Luís Filipe Cristóvão? Desconfio que por não terem falado do seu labor poético num artigo intitulado “Há sangue novo na poesia portuguesa”, capa do suplemento Ípsilon publicado hoje com o jornal Público. Talvez o Luís gostasse de se ver referido entre os “novíssimos poetas portugueses” ali mencionados. Afinal, respeita os critérios impostos pelo autor do artigo: tem menos de 40 anos (nasceu em 1979) e não publicou nenhum livro antes de 2002 (o primeiro, Registo de Nascimento, data de 2005). Luís Miguel Queirós preferiu mencionar outros emergentes, tais como Alexandre Nave, Rui Pedro Gonçalves, António Gregório, Rui Lage, Miguel-Manso, Renata Correia Botelho e Margarida Vale de Gato. À eventual indignação do Luís, poderíamos juntar a eventual indignação de Filipa Leal, Catarina Nunes de Almeida, Hugo Milhanas Machado, manuel a. domingos, Rute Mota, Vítor Vicente, Alexandre Borges, Ana Salomé, Rui Costa, Joana Serrado, André Sebastião, Pedro Afonso, José Rui Teixeira, entre outros que para aí andam e não me levarão a mal a omissão. Mas não há razão para tanto, até porque o artigo assinado por Queirós, dentro dos condicionalismos que o tema impõe, está bem escrito, fornece a informação indispensável (referindo editoras e revistas de poesia, assim como algumas livrarias com estantes dedicadas ao género), revela atenção ao fenómeno da poesia na Internet, levanta as dúvidas mais pertinentes e chega a arriscar algumas respostas. O destaque atribuído à revista Criatura é, quanto a mim, desmesurado. Que Nuno Júdice e Manuel de Freitas se tenham referido à Criatura, com mais ou menos cautela, na imprensa escrita, não é de admirar. O primeiro foi convidado a apresentar a revista no seu lançamento; o segundo é citado por dois dos directores da revista como uma referência e é abundantemente divulgado no weblog de um deles. Que fique clara a minha simpatia quer pelo primeiro número da Criatura, quer pelos seus colaboradores (alguns dos quais já tive o prazer de conhecer pessoalmente ou ciberneticamente), mas a ideia de “estar ali um embrião de uma nova geração de poetas” parece-me completamente disparatada e até injusta para com colaboradores que já não são novos nestas andanças: casos de José Carlos Barros e Marta Caldeira. Aliás, sobre novas gerações, novíssimos e emergentes muito haveria a dizer. Como já me vai faltando alguma paciência, convido-vos a reler um dos primeiros posts da Maria João no Insónia:
Emergente é um artista surgindo, primeiramente, em eventos colectivos cheios de gente, organizados por gente que já foi emergente, os emergentes seniores, que só organizam os eventos com emergentes, para poder dizer que também trabalham com gente. Os emergentes produzem arte política com novas tecnologias, usando títulos em inglês, porque apesar da emergência ser portuguesa, existe sempre a estratégia da internacionalização, uma emergência com carácter universal. Os emergentes produzem multimerdas, com o objectivo de serem sempre coerentes, não se vá dar o caso de deixarem de ser emergentes e fazerem-se gente, numa retrospectiva onde sejam julgados absurdos na sua emergência. A emergência é uma estratégia eficaz e coerente, apesar dos emergentes terem sempre um certo espaço para a incoerência, porque o emergente é um artista enquanto novo. Emergente, à superfície, é um novo detergente: lava velhas nódoas, entranhadas, mas não deixa a roupa branca, não, até porque o sujo já está lá há muito mais tempo.
A citação não deve impedir a leitura do post na íntegra. Podem fazê-lo aqui.
Emergente é um artista surgindo, primeiramente, em eventos colectivos cheios de gente, organizados por gente que já foi emergente, os emergentes seniores, que só organizam os eventos com emergentes, para poder dizer que também trabalham com gente. Os emergentes produzem arte política com novas tecnologias, usando títulos em inglês, porque apesar da emergência ser portuguesa, existe sempre a estratégia da internacionalização, uma emergência com carácter universal. Os emergentes produzem multimerdas, com o objectivo de serem sempre coerentes, não se vá dar o caso de deixarem de ser emergentes e fazerem-se gente, numa retrospectiva onde sejam julgados absurdos na sua emergência. A emergência é uma estratégia eficaz e coerente, apesar dos emergentes terem sempre um certo espaço para a incoerência, porque o emergente é um artista enquanto novo. Emergente, à superfície, é um novo detergente: lava velhas nódoas, entranhadas, mas não deixa a roupa branca, não, até porque o sujo já está lá há muito mais tempo.
A citação não deve impedir a leitura do post na íntegra. Podem fazê-lo aqui.
9 Comments:
Caro HMBF, nós no Pisca de Gente, sobre o assunto em apreço, consideramos o seguinte: http://piscadegente.blogspot.com/2008/09/polcia-do-gosto-potico-pgp-em-portugal.html. É poucochinho, é tristinho, é a vidinha. Mas que podemos fazer se os LMQ deste mundo são assim e não de outra maneira? Cá para nós ele ainda não teve foi coragem para publicar os poemas que escreve.
Abraço do
Pisca
Apenas para dizer duas coisas.
A primeira é para me penitenciar por não ter referido este blogue no meu artigo. Conhecia-o e tinha intenção de o citar, mas, ao escrever o texto, pura e simplesmente esqueci-me de o fazer. Muitas vezes até não estou nada de acordo com os juízos de Henrique Fialho, mas, enquanto esforço sistemático de divulgação – e comentário – da mais recente poesia portuguesa, julgo que este blogue é um caso único.
O seu autor teve a elegância de não me apontar essa omissão, mas aponto-a eu com gosto.
Do que já não me penitencio é de não ter citado os poetas a que H. F. alude no seu post, com excepção de Rute Mota e Vítor Vicente. Não sei se lamento ou não a omissão destes dois nomes, porque não me lembro de ter lido nada de nenhum deles. Não o confesso de consciência tranquila, embora o propósito de ler tudo – mesmo no campo específico da poesia portuguesa recente – seja, nos tempos que correm, uma ambição cada vez mais utópica. Quanto aos outros, uns conheço melhor, outros pior, e de alguns julgo que li tudo o que publicaram. Como se compreenderá, se não os citei foi porque, até agora, me interessaram menos do que aqueles a que aludi. De resto, poderia citar vários outros nomes que não referi no meu texto, mas de que gosto mais do que de alguns dos que H.F. indica na sua lista. É o meu gosto. Não o prezo especialmente, mas tenho de me amanhar com ele, porque é o único que tenho. Ou que vou tendo, já que, felizmente, não é imutável.
A segunda é para fazer um comentário ao comentário de Pisca. Segui o endereço fornecido e fui ler o que escreveu no seu blogue, mas não há nada nesse texto que exija resposta. O que a justifica é a frase com que Pisca encerra o comentário que deixou aqui. Dado que usa o verbo “escrever” no presente, parece claro que está a sugerir que eu terei escrito poemas num passado recente. Ora, tendo em conta que não escrevo nenhum poema há uns bons vinte anos – e que por acaso até publiquei alguns dos que escrevi antes disso, o que, de resto, não exigiu coragem nenhuma, mas tão-só alguma juvenil ausência de sentido auto-crítico –, deduz-se que Pisca está a mentir deliberadamente ou, numa interpretação mais benigna, a atirar o barro à parede.
A coisa não tem importância nenhuma, mas irrita um bocadinho, porque é um exemplo típico desse modo de criticar (se o verbo tem aqui aplicação) que se resume a insinuar que o criticado age (neste caso, escreve) de má fé e roído por ressentimentos e frustrações.
Porque é que não diz simplesmente que eu sou um imbecil, que não percebo nada de poesia, que, para meu próprio bem, deveria guardar para mim próprio os disparates que me vêm à cabeça quando tenho a insensatez de a tentar ler, enfim, qualquer coisa deste género. Descontado o imbecil, que talvez me pareça uma definição imprecisa, até tenderia a dar-lhe razão.
Uma última nota a propósito da referência de Henrique Fialho a José Carlos Barros, cuja obra venho acompanhando com curiosidade desde os anos 80, quando publicou um primeiro livro (acho que é o primeiro) em colaboração. Nos jornais há contingências de espaço, e o texto que escrevi sofreu vários cortes de última hora, o que, evidentemente, se serve de justificação factual, não serve de desculpa. Num dos parágrafos que caiu, dava justamente o exemplo deste poeta, salvo erro nascido em 1963, para ilustrar a diversidade etária dos colaboradores de Criatura, e acrescentava que há muito me parece injusta a quase nenhuma atenção que a sua obra tem merecido, ainda que essa desatenção possa em parte ficar a dever-se ao facto de os seus livros, alguns deles editados por autarquias, terem tido circulação bastante restrita. Ainda assim, se não me falha a memória, aparece na antologia organizada por Pedro Mexia, que não tenho agora à mão. E julgo que hoje já será bastante mais lido, por causa do seu blogue Casa de Cacela.
Pedindo desculpa por esta minha extensa invasão da sua caixa de comentários,
Um abraço,
Miguel
Bem me parecia que devia ter estado quieto. Após ter enviado o comentário, reli o de Pisca, e parece-me muito provável que o tenha treslido. Invoco uma atenuante: tem sido irritantemente frequente que pessoas a quem não agradou o que escrevi (ou o que não escrevi e devia ter escrito) sobre a poesia delas, ou sobre a poesia de poetas de quem gostam, evoquem directa ou insinuadamente essas patacoadas poéticas que escrevi aos vinte anos (num meio pequeno, tudo se sabe) para sugerir que, quando escrevo sobre terceiros, o faço movido por obscuros ressentimentos. Pensei que era mais um a bater na mesma tecla. No entanto, ao reler a frase de Pisca, percebi que o mais natural é que ele tenha apenas querido dizer: "Cá para mim ele escreve poemas, mas ainda não teve foi coragem para os publicar". A ser assim, limitou-se a lançar um palpite, pelo que lhe peço desculpa por aquilo que, no que escrevi, decorria directamente da minha eventual interpretação errada da sua frase.
Miguel
Filosofiasobsol.blogspot.com
Sem a intenção de ser um emergente, mas apenas de comungar, o bel prazer de escrever, com os que têm a rara sensibilidade de apreciar a boa poesia como uma forma de arte, e não como algo especulativo ou como uma forma de auto promoção.( me desculpem se estiver equivocado).
abraço...
O artigo era sobre a nova poesia. É arriscado escrever assim. O mais normal é fugir ao assunto -- porque dá nisto. A peça é boa -- e há-de ter as omissões todas que quisermos -- muitas serão. Podia pegar-se nisto de outro modo -- de mil outros modos. LMQ pegou assim, com o pretexto de uma nova revista. Acho bem que se critique. Pela razão simples desde logo de que me parece óptimo que se discutam estas coisas -- para que se discutam alguém tem que pegar no assunto. (O LMQ não me citou. Não sou «um poeta jovem». Que parece que era o que estava em causa.) Se não houvesse razões para polémica -- ficaríamos todos desiludidos. Falou-se de poesia jovem -- com uma chamada de primeira página no Público. Parece-me bem. Há ali gente de que se começa a falar que vai dar que falar -- que escreve bem. E é assim.
Concordo com o último comentário. O artigo éstá escrito com a latitude suficiente e as auto-interrogações que o tema justifica, quando só 8 anos passaram desde 2000, para proceder a "calibragens" geracionais, sempre discutíveis, como se sabe.
LMQ tem um vasto e não substimável conhecimento sobre a escrita poética,os seus autores, a edição e difusão literária.
Sempre li os seus textos com muito interesse.
E o argumento infantil de que quem não "faz", não pode criticar levar-nos-ia longe...porque só os músicos poderiam falar de música ou os pintores de pintura.
o artigo tem claramente uma intenção:
promover a revista criatura
e o autor Diogo Vaz Pinto.
o ridiculo é que nao foi nada discreto.
se fosse uma referenciazinha... ainda passava...
mas assim faz com que as pessoas procurem a grande "mina de ouro" que supostamente é a Revista Criatura.
qd lá chegamos é afinaal uma mina de carvao.
jornalismo barato o do Publico hj em dia:(
vou estar atento a esse Miguel Queirós...
Estes títulos desviam-nos sempre da questão principal e são uma opção editorial banal que, ao longo do tempo, vimos repetir nos vários campos das artes sob as mais variadas formas ("novos novos", "novos e consagrados", etc., etc, etc.). A cautela reiterada nessa avaliação que encontramos no artigo será, por esse motivo, de louvar.
Haverá uma nova geração? certamente. Serão estes os seus autores? Daqui a 50, 100 anos alguém o dirá, usando, seguramente, mais critérios. Confesso que, no presente, essa necessidade de referenciar e catalogar me parece precipitada... Ainda assim, concordo com o José Carlos Barros, com a Inês Lourenço. Nunca é demais que se fale de poesia.
(já agora, também não sou "poeta jovem"... :)
tem a importância que cada um lhe quiser dar.
por vezes é complicado pensar em "gerações disto ou daquilo", porque cria uma estranha ideia de vínculo.
mas tenho a ideia de que não tem que haver melindres por inclusões ou omissões desta ordem.
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