6.10.05

ALQUÍMICA

É sobre as pedras que os corpos se apuram.
Entram pelas mãos, dispõem olhos pela luz.
Disse ao meu irmão: que fracos somos
quando queremos arder. E disse-lhe:
que fortes. Que imensamente voz no poderoso
rio da cabeça.
Então quis sucumbir à lentidão da fome.
Trouxe laranjas para um deus menor como
um dia alto. Perdi-me num campo de papoilas,
descrendo dum amor brutal e sem consequências.
E era eu muitas vezes, o corpo arqueava sumptuosas
ironias.
depois, não há depois. há uns olhos sulfurosos
a decantar paisagens gordas.
canteiros de armas,
cintilações de rosas. a minha mãe exposta como um templo
no princípio de outra coisa. e a vida. qualquer coisa breve
para entenderes: um sino ou uma ideia.
palavras pequenas do tamanho do mundo
pessoas do tamanho de palavras do tamanho do mundo
sentadas encostadas ao destino da raiva no mundo
perdidas por dentro achadas ao centro
de si próprias do mundo

Rui Costa, A Nuvem Prateada das Pessoas Graves, Quasi, 2005.
Rui Costa

1 Comments:

At 5:38 da tarde, Anonymous Anónimo said...

ja li este livro avidamente, e voltei a ele com a necessária calma. mas só agora reparei nesta passagem
--
"há uns olhos sulfurosos
a decantar paisagens gordas."
--
muito bom.
Aurora

 

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