Fragmento #29 - Quarto
Ainda é muito cedo e tenho de acordar. Não me peças para dizer essas palavras quando os teus olhos olham no fundo dos meus. Vou dar-te outras que se aproximam melhor do que receio, quando os teus olhos entram assim. Saio fora de mim no fundo dos teus olhos e sou apenas aquilo que se desfaz nas tuas mãos. Olhas-me no fundo dos olhos e dizes que começa bem. Afinal o mundo não existe e mostras-me nas palavras que existem vários mundos. Já sabíamos. Também sabias que os outros têm coisas mais importantes em que pensar e existem vários mundos que não existem, existindo. Existem palavras que só conheço na ficção das tuas mãos quando me tornam real. Perguntas-me pelos textos e os teus olhos não estão cá os textos os textos os textos e perco-me dentro deles. Saímos quase ao mesmo tempo, depois dizes que chegaste aqui já não é a primeira vez. Digo desejo. Digo que nada mudou, já saímos, não avançou mas é isso que te preocupa. Não te preocupes que eu estou aqui e sou nas tuas mãos minhas, nos teus olhos saio de dentro delas. Não sei se já acordei. Nos sonhos também estamos acordados e acordamos quando sonhamos. Existem palavras reais, não me peças para as dizer essas palavras. Digo que os teus olhos vêem mais que qualquer máquina e ainda não inventaram uma tão perfeita, por isso, desejo sentir-te como um todo a frasear. As tuas mãos estão dentro dos meus olhos a escrever pictoricamente. A língua fraseia e vai para além das imagens e tu falas com os olhos no outro lado do espelho. As imagens são representações nos teus olhos para além de qualquer convenção, dizendo na língua contornando os meus nas tuas mãos das minhas mãos. Afinal existem vários mundos. Tu procuras o mundo nos meus olhos que não te respondem, pois sei que o mundo não existe e existem vários mundos. Já sabíamos que era assim e existem palavras que só conheço na ficção. Por isso, não me peças que te diga essas palavras. Dá-me antes as tuas mãos para que possa escrever descrevendo-te assim.
Maria João
Maria João
2 Comments:
este texto é muito bom Maria João...peço desculpa por tê-lo deixado escapar... só hoje tive oportunidade de o ler
Obrigada, Victor.
Maria João
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