3.9.06

O que resta

Aprecio numa mulher as olheiras cansadas, uma unha roída até ao sabugo. Fixo-lhe os peitos, miro-lhe as nádegas, aprecio-lhe a anca. Também gosto de lhe olhar as pernas. Pernas paradas, cruzadas, estendidas, em movimento. Lábios são matéria demasiado sensual. Prefiro rostos sem lábios. Os lábios intimidam-me, talvez porque me dêem sempre uma animalesca vontade de os comer. Não deve haver nada pior num homem que a exposição abrupta do desespero sexual. Os lábios provocam-me esse tipo de aflição. O mesmo se passa, por vezes, com as bochechas, o pescoço e com alguns dedos. Uns dedos esguios e seguros são como as flechas de Cupido. O que não me diz mesmo nada são os olhos. Os olhos são o fundo dos corpos, são aquilo que denuncia a morte num corpo, são uma espécie de usurpação do belo. Estou em crer que os olhos, de tão próximos estarem da essência, dão quase sempre cabo do prazer que é ficar pela aparência. Por isso prefiro chegar aos olhos no fim, depois de ter visto tudo o que resta.

6 Comments:

At 8:04 da tarde, Blogger Manel said...

:I

 
At 8:20 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Mais do que isto, só dito com o olhar, para lá da tela.

 
At 9:09 da tarde, Anonymous Anónimo said...

isso mesmo, senhor.
Rui Costa

 
At 10:40 da tarde, Blogger margarete said...

:) que bonito.

 
At 5:18 da tarde, Blogger MJLF said...

Um texto mesmo à Henrique.
Maria João

 
At 8:00 da tarde, Blogger Silvia Chueire said...

Excelente !

 

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