13.7.07

JORNALISMO DE REFERÊNCIA

Tenho com os jornais uma relação muito similar à que mantenho com os cigarros. Tão depressa os abandono como volto a eles. Ainda que seja mais resistente ao apelo dos jornais que às exigências dos cigarros, de quando em vez tenho uma recaída e saco umas moedas da carteira que invisto na jornalada. Quase sempre me arrependo, mas isso também acontece com os cigarros. Sobretudo porque sou asmático. Já fiz referência ao facto de ter deixado de comprar jornais, o que me valeu a acusação de pretender chegar a Presidente da República do meu país. Não é esse o caso. Mesmo que fosse, não começaria por deixar de comprar jornais. Preferiria começar por, de alguma forma, comprar jornalistas. Sendo esse outro assunto, mais pesaroso e, por isso, menos interessante, prefiro por agora concentrar-me num exemplo do que para mim pode ser o jornalismo dito de referência. Calhou que na semana passada me viesse parar às mãos um exemplar da Notícias Magazine, revista publicada, como deveis saber, pelo jornal Diário de Notícias. A páginas 8, deparo-me com crónica de animado enlevo pela pena sempre sábia e irreverente da esbelta jornalista Fernanda Câncio. Quererão os leitores deste humilde texto saber sobre que assunto versava a dita. Pois bem, não me é possível satisfazer tal pretensão. Mas o enlevo era inegável, motivado por razões que à pena da jornalista escaparão mas às penas de um homem jamais passam despercebidas. Reparai, caro leitor, na imagem da jornalista sobressaindo no manto de caracteres como só as mais belas flores sobressaem nos mais harmoniosos jardins. Olhei a página e pensei: isto devia ser sempre assim. É verdade que também logo se me formou a imagem no pensamento de uma página como esta assinada, vá lá, por um Pedro Mexia em pose similar, ou um Vasco Pulido Valente, ou um Rui Tavares… Subitamente concluí que, em nome do bom gosto e da nossa sanidade estética, aquilo não deve nem pode ser sempre assim. Mas com a jornalista Fernanda Câncio o grafismo adoptado resulta. Duas páginas depois, tratamento diverso foi dado à socióloga Maria da Paz C. Lima. Na sua crónica, tem direito a pouco mais que uma fotografia algo desenxabida. Nada contra os dotes feminis da autora, entenda-se. Mas por que não permitir à socióloga cativar os olhos dos leitores da mesma forma que à jornalista foi concedido esse direito? Digo mais. Não só estou convencido ser da mais elementar injustiça não oferecer à socióloga Maria da Paz C. Lima uma página com o mesmo charme, como julgo estarmos perante um caso de verdadeira discriminação editorial. Como tal, proponho que em próxima edição a socióloga apareça também em pose atraente e sensual. É uma proposta sincera e honesta, que faço apenas em nome de um jornalismo que se quer cada vez mais de referência e referencial. Porque não desejo alongar-me muito sobre o tema, permito-me apenas terminar com uma humilíssima sugestão que daqui envio à socióloga Maria da Paz C.:

26 Comments:

At 1:27 da tarde, Blogger MJLF said...

Me gustaria mucho ver al Mejillon en una gran foto de majo nel periodico, los hombres tienen de seguir los buenos exemplos de mujeres como Fernanda Câncio nel mundo pós-feminista actual.
Maria João

 
At 1:40 da tarde, Anonymous Anónimo said...

ainda não me cansei de ver a Câncio - canse-o você, diz-lhe a outra senhora que é socióloga!

 
At 2:43 da tarde, Blogger EU.CÁ.VOO.CAMINHANDO said...

Este tipo de ironia (leve, despojada e aparentemente doce..) sabe-me bem, nos tempos que correm_______________________

 
At 3:28 da tarde, Anonymous Anónimo said...

jornalismo de referência, depende.
gaf

 
At 6:51 da tarde, Anonymous Anónimo said...

etanol, há gostos para tudo :)

josé alberto mar, obrigado pelo comentário. volte sempre;

gaf, tudo depende... inclusive o depende que também depende de depender ou não depender...

 
At 7:55 da tarde, Anonymous Anónimo said...

falei a sério, esse jornalismo indicado não é de referência para mim nem para muita gente, mas pode ser para outra, claro. Com a tabloidização crescente, deixa de haver referência no sentido que se lhe dava, ou então a referência é o tablóide. Acho que ainda há bons jornalistas (de referência), mas de pouca visibilidade, porque o jornalismo está mau. Portanto, falei a sério, pensei que tivesse compreendido sem toda esta minha explicação. no fim disto, o seu jogo de palavras com o depende é uma brincadeira inocente, não é?
gaf

 
At 8:59 da tarde, Anonymous Anónimo said...

claro que é, gaf. aliás, todo o post o é. falando a sério, o «diário de notícias» já foi jornalismo de referência. agora é só, cá vai mais um trocadilho, de deferência. e é pena. era um bom jornal. quanto ao post, é só uma reacção às virtudes do grafismo na paginação dos jornais e das revistas da actualidade: meter o autor, em pose, dentro do texto.

 
At 9:59 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Mas que recurso linguístico é esse do autor sensualmente entremeado no texto?
Faz parte da TLEBS?

 
At 10:02 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Sugestão: tira os olhos da Fernanda Câncio e olha para as palavras da Alexandra Lucas Coelho.

 
At 10:19 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Quanto à F. Câncio conheço-a do Cinco Dias, mas não é que vá ao Cinco Dias por causa dela, portanto não se me tome por defensor dela, nem ela precisa. Nunca fui jornalista mas já trabalhei em jornais como revisor e sei como funciona uma redacção. Talvez, digo talvez, a F. Câncio tenha mandado ou entregue simplesmente o seu texto, e a exibição do seu corpo e do seu nome em garrafais, ao contrário da outra, não seja obra ou desejo dela mas sim do todo-poderoso chefe de redacção que manda paginar assim ou assado. No fundo, ela só é culpada do texto que escreveu (incompreensível, ao que parece).
gaf

 
At 10:53 da tarde, Anonymous Anónimo said...

O post não deixa de fazer todo o sentido, poque afinal o resultado é aquilo que se vê.
Mas, na linha do que disse o último "anónimo", acho que aquilo foi uma coisa da redacção, se calhar nem foi o "todo-poderoso chefe" - pior ainda - foi um qualquer curioso a quem calhou fechar a edição...

 
At 1:01 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Vamos lá a ver. O meu post pretendia ser apenas um comentário jocoso a uma situação complexa, que é a do tratamento gráfico dos textos em função de quem os escreva, mais evidente nas revistas mas também ameaçador nos jornais – veja-se a remodelação de que o Público foi alvo. Fernanda Câncio, jornalista e blogger que leio com agrado – muito empenhada, como eu tentei aqui empenhar-me, na luta pela despenalização do aborto – não terá nada que ver com isso. Nem é isso que aqui importa. Mas por que não há-de merecer a senhora socióloga uma fotografia do mesmo género numa coluna de opinião na mesma revista, na mesma semana, apenas separada por uma página? A Fernanda Câncio é mais sensual? A fotografia acrescenta alguma coisa ao texto? O que importa naquela página? O texto? A imagem da autora? As duas coisas? É óbvio, pelo menos para mim, que isto é apenas questão merecedora de um post jocoso. Não me interessa pensar muito sobre o assunto. Mas já agora, julgo haver, do ponto de vista de quem pensa aquela página, um aproveitamento da imagem da autora do texto. Esse aproveitamento está, quer queiramos quer não, relacionado com outras questões que têm que ver com o aproveitamento da imagem feminina na nossa sociedade. Já aqui tenho escrito sobre isso. Por isso me interrogo por que não dar à senhora socióloga o mesmo tratamento, uma foto em pose similar, ou, alternativamente, com a pose da moçoila que deixei em sugestão.

Sissi, sinceramente não entendi a dúvida? De onde vem essa «do autor sensualmente entremeado no texto»? Eu só falo «na imagem da jornalista sobressaindo no manto de caracteres como só as mais belas flores sobressaem nos mais harmoniosos jardins». :) Quanto às palavras da Alexandra Lucas Coelho, bem… prefiro continuar com os olhos na Fernanda Câncio.

Gaf, ninguém está aqui a intervir contra a jornalista Fernanda Câncio. Espero que isso tenha ficado claro.

Lutz, obrigado… mesmo que não seja para mim. :)

Eduardo Barrento, aquilo é coisa de um apaixonado da Câncio. :)

 
At 8:48 da manhã, Anonymous Anónimo said...

A última intervenção de hmbf: acho que toda a gente percebeu, o seu post é claramente irónico, ataca o método tabloidoide e não Câncio. Só quis lançar alguns pormenores para se ver melhor a coisa e, talvez, avançar um pouco mais na reflexão sobre o estado da nossa imprensa. A Câncio é uma simples cronista, nem deve pôr os pés muitas vezes na redacção. O episódio é comezinho, mas há casos mais graves: o jornalista vê o seu texto cortado ou alterado, há uma «censura» interna auto-consentida e, muitas vezes, as ordens nem vêm do director ou do editor mas de cima: do partido, do ministério, do cardeal... Não digo que a liberdade de o jornalista informar seja uma treta, mas é condicionada por muitas coisas. E, também, devemos estar muito atentos ao que «eles» estão a cozinhar sobre a maneira de condicionar ainda melhor o informador livre.
gaf

 
At 10:11 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Pois, Gaf. Mas essa é outra questão, sempre bem lembrada, que eu, por acaso, também não esqueci neste texto quando disse: «Já fiz referência ao facto de ter deixado de comprar jornais, o que me valeu a acusação de pretender chegar a Presidente da República do meu país. Não é esse o caso. Mesmo que fosse, não começaria por deixar de comprar jornais. Preferiria começar por, de alguma forma, comprar jornalistas.»

 
At 12:55 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Rectificação da minha
sugestão anterior: tirar os olhos da Fernanda Câncio e olhar para as suas palavras.
Mas tu és homem.
Eu sou mulher.
Digam o que disserem é um factor a levar em conta, independentemente de isso significar algo de literalmente óbvio nas nossas preferências.
A questão editorial e jornalistica é outra praça...

 
At 1:36 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Por que não teve a senhora socióloga direito ao mesmo tratamento gráfico? A haver questão, é só esta a questão. Mas ainda ninguém quis responder a esta questão.

 
At 3:57 da tarde, Anonymous Anónimo said...

porque a outra senhora é socióloga, logo vale pelos miolos e não pelo corpo?
porque já transcendeu o domínio do físico com o peso do seu cérebro?
porque (sem ofensa) é mais velha e pede-se-lhe uma postura mais recatada?
porque não tem um corpo/ imagem que vá de encontro ao que consideramos sex-appeal hoje?
eu não acho mal juntar o útil ao agradável. se o artigo tem de ter uma foto do autor/autora, pois que tenha uma em todo o seu esplendor! e se um desses autores tem uma foto destacada, os outros também deviam ter, mais que não seja, por causa da harmonia do design da revista (ou coisa parecida.)

 
At 3:59 da tarde, Anonymous Anónimo said...

talvez a pergunta deva ser ao contrário: por que não teve a Câncio direito ao tratamento gráfico da Maria da Paz?

:)

 
At 6:11 da tarde, Blogger manuel a. domingos said...

por que não foram roma e pavia construídas num dia?

 
At 8:26 da tarde, Anonymous Anónimo said...

E que aspecto teria o seu arquitecto?

 
At 10:13 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Gostei da resposta da Ana Sofia. Pareceu-me honesta. O que julgo ridículo é aquelas mulheres que usam grandes mini-saias mas detestam que lhes gabem as pernas, ou andam com avantajados decotes mas irritam-se quando alguns olhos lhes caem em cima do decote. É claro que isto não tem nada que ver com ser inconveniente. Mas se alguém usa uma mini-saia, não há-de ser para depois passar o tempo todo a puxá-la para o joelho. Penso eu de que…

A pergunta do Fernando também é boa. ;-)

 
At 12:40 da manhã, Anonymous Anónimo said...

que a Fernanda me canse-o.

Rui Costa

 
At 12:47 da manhã, Anonymous Anónimo said...

obrigada. isto partindo do princípio que é o tratamento dado à foto da fernanda cêncio que está certo, claro. concordo com a questão da mini saia e das pernas. é assunto que daria pano para mangas.

 
At 1:15 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Rui Costa, eesa já tínhamos dado na aula do doutor anónimo, segundo comentário, e não vai sair no teste.

 
At 1:47 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Já se meteram demasiados alhos com bugalhos nesta panela.
E concordo com a Ana Sofia. O assunto da mini saia e dos decotes tem pano para uma tenda de circo.

 
At 4:52 da tarde, Blogger redonda said...

:) Que sugestão :)

 

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