APRENDER A CONTAR #23
ASNOGRAFIA
Leio num dicionário: «Asnografia: s. f.: diz-se, ironicamente, da descrição do asno».
Pobre asno! Tão bondoso, tão nobre, tão inteligente como és! Ironicamente... Porquê? Nem uma descrição séria mereces tu, cuja descrição exacta seria um conto de Primavera? Se ao homem que é bom deveriam chamar asno! Se ao asno que é mau deveriam chamar homem! Ironicamente... De ti, tão intelectual, amigo dos velhos e das crianças, dos regatos e das borboletas, do sol e dos cães, das flores e da lua, paciente e reflexivo, melancólico e amável, Marco Aurélio dos prados...
Platero, que sem dúvida compreende, olha-me fixamente com seus grandes olhos brilhantes, de uma serena firmeza, onde o sol brilha, diminuto e refulgente, num breve e convexo firmamento negro. Ai! Se a sua peluda cabeçorra idílica soubesse que eu lhe faço justiça, que eu sou melhor que esses homens que escrevem Dicionários, quase tão bom como ele!
E escrevi à margem do livro: «Asnografia: s. f.: deve dizer-se, com ironia, claro está!, da descrição do homem imbecil que escreve dicionários».
Juan Ramón Jiménez (1881-1958), Platero e Eu, trad. José Bento, pp. 45-46, Livros do Brasil, s/d.
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1 Comments:
Lindo!
:)
Maria João
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