Para o postador nato a dificuldade está em não fazer o post excelente, fabuloso, fundamental. Ou seja, o post perfeito. O post imperfeito é que é o grande, o único objectivo. Só as loucas é que sonham com os príncipes encantados. Ou seja: altos, fortes, esbeltos, além de corajosos, gentis, amorosos, enfim, perfeitos. Isto é: chatos como a potassa posta em sossego no tubo de ensaio com uma boa meia-dose de pó de talco. A potassa no fundo do tubo, de saia recolhida e pés para dentro, a cabeça inclinada devido à vergonha e a doses maciças de educação sentimental, o nosso pó de talco bem aprumado, com as mãos nos bolsos, no outro canto do tubo, a olhar para o céu, um exemplo de virtude, pensando agora se não há-de tirar as mãos dos bolsos, a primeira meia hora passa, olhando agora para as pontas dos sapatos, uma mancha ali, não sei como é que não vi, por causa disto quase se sente indisposto, pensa desistir, entretanto é outono e a potassa continua completamente educada do outro lado do tubo, certamente um pouco mais impaciente, quem é que pode censurá-la, com o frio que faz e agora já às portas do Inverno, o nosso herói resolve tomar a iniciativa, diz "já te dava uma...", a potassa estica a cabeça como que a confirmar aquilo que ouvira, de quase adormecida que estava, não a enganaram os ouvidos, posso confirmá-lo, eu sei melhor do que vocês porque sou eu que estou a relatar esta história, ela pensa "estava a ver que não", e o que pensa a seguir não anuncia, porque é educada, mas digo-vos eu, para que não digam que estou em vantagem, "estava a ver que não desenguiçava", é o que ela pensa mas não diz, embora não lhe falte vontade, de dizer e talvez de algo mais, mas agora já estou a pôr a carroça à frente dos bois, digo, dos dois, foi ele agora quem falou, "já te dava um soneto de amor", continua, cavalheiro, generoso como sempre, e ela pensa mas não diz "se me desses mas é outra coisa", mas o que ela lhe responde é, "ai que simpático, e ainda por cima tão tímido", e ele sorriu-se e nós sabemos que corou, é fiel o relato deste pequeno romance, pequeno em tamanho por ter o seu palco num tubo de ensaio, grande no sentido, porque aquele tubo de ensaio é uma metáfora do universo, prossigamos, veio a primavera com os seus aromas e chilreios, passou a sua frescura e passamos nós ao verão, quase não bastam os corpetes à nossa potassa para conter a exultação interior, é da paixão que a distância alimenta e a paciência consome, se não leram as doze últimas linhas também não perderam muito, está tudo na mesma, com a diferença que apontei, agora é verão, quem sabe as surpresas que nos reserva, veremos, a nossa potassa ofega com a temperatura, ardem-lhe os pensamentos na cabeça, agora quase fomos poéticos, perdoe-se-nos o excesso, o verão quando nasce é para todos, a nossa potassa vitupera moderadamente a constrição dos folhos, a incomodidade que não lhe tolha a compostura, mas tolhe, a potassa respira e ao encher o peito de ar o dique cede, o decote da nossa heroína rebenta, o tubo de ensaio admite finalmente a sua pequenez e estilhaça-se em mil pedaços que voam pelo ar, o nosso herói não ganha para o susto e esconde-se debaixo do casaco, a potassa olha à sua volta e é o mundo todo que nasce da explosão, eu admito ter sido esta a origem do universo, mas isso é outra história, foi aprendida a lição, perfeição do caralho nunca mais, pensou a nossa potassa e disse-o, assim, com todas as letras, e foi o post mais imperfeito que jamais se viu.
Rui Costa