A conspiração dos mentirosos
Fui ao Nimas ver An Inconvenient Truth, o documentário de Davis Guggenheim com o ex-futuro presidente dos EUA – Al Gore. Enquanto comprava o bilhete fui informado da presença na sala de algumas visitas de estudo. Se bem sei, o documentário está em exibição no Nimas, no Amoreiras e no El Corte Inglés. Gostava muito de levar os meus formandos a ver este filme, mas para tal teríamos de conseguir um orçamento que suportasse a deslocação a Lisboa – aluguer do autocarro, gasóleo, portagens, bilhetes. É isto o ensino massificado, o direito à informação, a balela do ensino igual para todos. Uma treta! Os meninos de Lisboa poderão fazer do ensino uma festa, os restantes que aguardem pelo DVD. Desde que me lembro numa sala de aula, na qualidade de professor ou de formador, que abordo as questões ambientais. Geralmente começo pelo visionamento, seguido de debate, de Os Respigadores e a Respigadora, o excelente documentário de Agnès Varda. Fazemos assim a ponte entre os vícios da sociedade de consumo, consumismo desenfreado e desperdício, e as questões ambientais mais prementes, nomeadamente a escassez de recursos e a necessidade de reciclar. Depois partimos para a abordagem directa dos problemas ecológicos mais paradoxais. Os formandos elaboram exposições sobre energias renováveis, sobreaquecimento global, poluição dos solos, escassez de água potável, etc. Estes mesmos temas serão problematizados numa perspectiva de questionamento acerca do que poderá cada um de nós fazer para tornar o ambiente em que vivemos mais aprazível. A parte mais teórica surge então, com a análise de textos de Hans Jonas (conceito de contrato natural) e de Peter Singer (acerca da possibilidade de uma ética ambiental). Se ainda restar algum tempo, amenizamos o ambiente com o visionamento de Erin Brockovich, um filme de Steven Soderbergh que sempre estimula a perseverança e a vontade de mudar alguma coisa. Este Uma Verdade Inconveniente parece-me, então, um excelente documento didáctico para acrescentar à planificação anterior. Quando digo acrescentar, quero dizer também alterar, renovar, aperfeiçoar, na medida do possível. É um documento interessante, com uma linguagem bastante acessível, a tocar no essencial sem grandes pruridos políticos. É certo que a montagem não é das melhores, tornando por vezes descarada a intenção de uma auto-promoção que, do meu ponto de vista, acaba por ser legítima. Mas vale de facto a pena ouvir Al Gore e aprender alguma coisa sobre algo que já não é apenas um problema ambiental, na medida em que é cada vez mais um problema da humanidade enquanto parte interessada de um todo, o ambiente, no qual se inclui. Vou esperar pelo DVD.
No Y, uma pequena nota sobre Beyoncé dá conta de que «da mesma forma que o comunismo condenou o rock por ser ‘decadente’, também hoje as autoridades iranianas censuram os vídeos R&B – enquanto a juventude islâmica acompanha as nádegas de Beyoncé». Ora aí está uma forma subtil de educar as massas e de fazer política. Na verdade, o rock começou por ser condenado pelo capitalismo por ser desviante. Foi isso que levou muitos cantautores, com inclinações comunas, a prescindir da folk mais tradicionalista em prol das guitarras eléctricas. O revisionismo histórico está, sem dúvida, na moda. No meio disto, safam-se as nádegas – e não só - de Beyoncé.

Da esquerda para a direita: Jean Crotti, ?, André Breton, Jacques Rigault, Paul Eluard, Ribemont-Dessaignes, Benjamin Péret, Théodore Fraenkel, Louis Aragon, Tristan Tzara, Philippe Soupault.
Grávida da
Uma romancista turca, que desconheço, foi a tribunal sob acusação de insultos ao seu país. Levantou-se para aí uma onda, felizmente algo mansa, sobre o caso. Que as cabeças bem pensantes não se indignavam, que a liberdade de expressão já não importa, que isto, que aquilo. Chega entretanto a notícia de que Elif Shafak, assim se chama a romancista, foi ilibada em poucos minutos num tribunal de Istambul. Parece que as cabeças bem pensantes fizeram bem em esperar pelos factos para que a indignação pudesse fazer sentido, sob pena de, qualquer dia, a cada arroto que se ouça lá dos fundos das arábias ter que ser escrito um post sobre o assunto. Há de facto gente muito interessada em acicatar ânimos, gente para quem tudo tem que ter dois pólos, gente que não logra ver para lá dos emblemas, gente que se confunde com os próprios emblemas. Ninguém nega, ninguém pode negar, que no mundo dito ocidental há uma convivência com a liberdade de expressão que ainda não existe em muitos países de predominância islâmica. Essa liberdade de expressão é garantida, sobretudo, pela separação, mais ou menos evidente, dos poderes político e religioso. Por isso irrita tanto ver um Sócrates benzendo-se ao lado de padres que inauguram escolas do Estado. E era bom que não esquecêssemos, por exemplo, o que um sketch sobre a Última Ceia ou o Evangelho Segundo Jesus Cristo, de Saramago, provocaram ainda há não muito tempo na nossa sociedade. Gente estúpida, de vistas curtas, há em todo o lado, de todas as raças, cores e feitios. Era bom que não esquecêssemos, igualmente, as centenas de atentados contra clínicas de aborto levados a cabo por católicos fanáticos ou a forma como a Páscoa é celebrada por cristãos mais acérrimos. Era bom que não esquecêssemos muita coisa. Tal como convém sempre lembrar que uma capa como a do Inimigo Público de ontem, anunciando um Papa convertido ao islamismo, dificilmente seria bem aceite em muitos países islâmicos se invertêssemos ali alguns pormenores. Vivemos numa época em que o mais difícil é não ser tolhido pelo absurdo do radicalismo. Talvez daqui a uns anos venhamos a ter não um, não dois, mas muitos Grass arrependidos.
Guardo um Cartaz de 1999 - o antigo Actual - onde se procedia a um balanço da década que então findava. No que respeita à poesia, Osvaldo Manuel Silvestre raciocinava assim: «De facto, a década de 90 foi, no seu todo, mais pobre que a de 80, a qual fora já menos rica que a de 70, a qual fora por seu turno menos rica do que a de 60, que, essa sim, fora mais fecunda do que algumas das precedentes.» Eu não arriscaria hoje classificar a década de 1990 assim tão pobre, mas não me interessa agora discutir o assunto. Relembro o raciocínio porque me parece ser do mesmo tipo que aquele usado por Sérgio Lavos neste post, onde se vaticina a falta de originalidade que contamina o universo pop nos tempos que correm. Quanto a mim, o que de melhor teve a década de 1990, falando de música pop em sentido lato, foi o espírito de fusão (tantas e tantas vezes se apontava o ecletismo das mais variadíssimas bandas). Deste modo, o grunge, o trip-hop, o drum’ n’ bass, o post-rock, a world music, valeram, essencialmente, pela capacidade de misturar sons de proveniências diversas sob uma identidade própria e consistente. Talvez estejamos hoje num desses momentos de saturação em que o novo apenas germina mas não acontece. A tendência tem sido para a rememoração, para a revisitação, para o retro. Como o Sérgio diz, e bem, «tudo é pós-qualquer coisa e deixa de o ser ao segundo ou, vá lá, terceiro álbum». No entanto, não consigo ser tão assertivo quanto o Sérgio na assunção do fim de uma qualquer coisa que ainda agora começou. Não falarei de géneros, que esses todos os dias são engendrados por uma indústria ávida de modas e, talvez por isso, cada vez mais com a corda ao pescoço. Mas quando qualquer um de nós pode hoje fazer em casa, com a maior das facilidades, a música que mais aprecia, o que esperar do futuro? E se para tal nem é necessário saber tocar um instrumento, que podemos nós esperar? O fim? Julgo que não. O que tende a desaparecer, suponho, é a ideia de género musical, a ideia de «tipo de música», em prol de uma cada vez maior despersonalização das obras. Como as drogas geneticamente manipuladas à medida de cada um, assim será, muito provavelmente, a música do futuro. É para esse cúmulo relativista, em que tudo é criado à medida do indivíduo, que tendem as artes. Em cada um de nós, um artista. Em cada obra, um espelho. Em cada espelho, um reflexo desse vazio que subsume tudo à lei do nada. Se já não existem heróis, o futuro reserva-nos a morte dos ídolos. Seremos todos referências apenas de nós próprios e em nada buscaremos exemplo senão na nossa própria fome. Provavelmente, o nosso futuro será a vida tal como ela era há 3,3 milhões de anos.
( imagem respigada aqui)subject: RE:
acredita, tita, estás
nos meus favoritos. gravei-te
a cena que pediste, fixe que
gostaste. a tua cena também
é demais, até disse aos meus
pais. curtiram e perguntaram
quem eras mas sabes que a
minha cena é discreta e tal,
não sou muito de andar praí
a falar das minhas cenas, ou
das tuas, e se não te disse
digo agora curtia juntar a
tua cena à minha e fazíamos
uma cena só com nós os dois,
ok?
Rui Costa

Desde que Eduardo Pitta regressou de férias, é o terceiro link que faço para o Da Literatura. Que me perdoem pela ausência de espírito, mas a verdade é que "parti o caco a rir" ao ler este comentário a um post sobre O Bairro Alto. Pedro Schacht Pereira, Mellon Post-Doctoral Fellow no Department of Romance Languages da Universidade de Chicago (vejam, se não acreditam), não se lembra «de nenhuma cidade do mundo onde tenha estado que apresente um tal nível de sujidade». Terá Pedro Schacht Pereira, Mellon Post-Doctoral Fellow no Department of Romance Languages da Universidade de Chicago, alguma vez descido a Rabat? Já terá posto os pés em Bombaim? Eu, para não ir mais longe, achei Atenas infinitamente mais suja que Lisboa. Mas eu também nunca fui muito longe. E o Cairo? Bem, nem me quero lembrar. Onde terá estado Pedro Schacht Pereira, Mellon Post-Doctoral Fellow no Department of Romance Languages da Universidade de Chicago, para fazer uma afirmação destas? Esteve em Sevilha e, vejam bem, concluiu que as pessoas em Sevilha «são bem mais porcas que os portugueses». Quais portugueses? Os portugueses de Évora, de Bragança, de São Miguel ou do Faial? Pois claro. Portugal é o Bairro Alto e o resto é paisagem. Os portugueses do Bairro Alto que se cuidem, em matéria de porcalhice ainda vão ter que deitar muita coisa para o chão, «desde cascas de camarão a guardanapos usados», se quiserem bater os sevilhanos. Mas o mais incrível são as dúvidas que assaltam Pedro Schacht Pereira, Mellon Post-Doctoral Fellow no Department of Romance Languages da Universidade de Chicago, no final do comentário. Olhem só: «E depois, falando de movida... o que é que fazem tantas pessoas na rua até tão tarde? Apenas vejo gente a disparatar, a emborcar bebidas inclassificáveis através de garrafas de litro e meio, a enrolar charros de haxixe de qualidade duvidosa, uns atrás dos outros até à insaciedade total. E depois, o que é feito do olhar das pessoas?» Não quero parecer mal-educado, mas este Pedro Schacht Pereira, Mellon Post-Doctoral Fellow no Department of Romance Languages da Universidade de Chicago, anda a ver coisas a mais com olhos a menos. Deve ser dos estudos, já que aparenta saber o quão duvidosa é a qualidade dos charros que por ali se fumam. P.S.: Não é difícil encontrar fotografias do Bairro Alto na Internet.

Foto respigada aqui.- O General Loureiro dos Santos não é um santo, é vários.
- O General Loureiro dos Santos só pilota porta-aviões sensíveis e meigos.
- O General Loureiro dos Santos só pilota em pelota, para estar de igual para igual com o animal.
- O General Loureiro dos Santos tem a voz de um trovão e a ternura do orvalho.
- Se o General Loureiro dos Santos fosse atum, chegaria à nossa travessa pelo seu próprio pé.
- O pé do General Loureiro dos Santos é mais belo que a Vénus em Chamas.
- O General Loureiro dos Santos não encerra aos domingos.
- Queremos um General Loureiro dos Santos em cada rotunda de Portugal!
Rui Costa