Ontem, quando saí do Nimas, pus-me a pensar que não fui tantas vezes ao cinema este ano como em anos anteriores. Múltiplos factores terão condicionado essa realidade, podendo, no entanto, ser resumidos nesta triste constatação: uma carteira cada vez mais leve, uma vida cada vez mais pesada. Mas a verdade é que o ano cinematográfico, ao contrário do que vou lendo por aí, não me estimulou o suficiente para abrir os cordões à bolsa (não sei se estão a ver, mas viver na província quadruplica o preço de um bilhete de cinema: gasolina, portagens, estacionamentos…).
Vamos por trimestres. O primeiro foi invariavelmente marcado, quer queiramos quer não, pelos vencedores dos Óscares do ano precedente. A excepção foi «Nada a Esconder», thriller de Michael Haneke, que não me agradou tanto como outros filmes do mesmo autor. «Match Point», de Woody Allen, deixou-me um travo de mais do mesmo. Gostei de «Munique», de Steven Spielberg, talvez mais por ser fã do realizador de «Tubarão», confesso, do que propriamente pelo filme em si. Retenho do primeiro trimestre de 2006, no que a Óscares diz respeito, dois filmes que me pareceram muito bons: «O Segredo de Brokeback Mountain» - nomeado para melhor filme -, de Ang Lee, e «Syriana» - com prémio para o desempenho de George Clooney -, de Stephen Gaghan. Houve ainda um menos mau «Capote», que valeu o Óscar para melhor actor a Philip Seymour Hoffman. Seja como for, o grande filme do primeiro trimestre de 2006 foi, quanto a mim, «Uma História de Violência», de David Cronenberg. E nem sou especial admirador da cinematografia de Cronenberg.
Quanto ao segundo semestre, o destaque vai direitinho para um documentário de 2004, realizado por um brasileiro residente em Portugal. Refiro-me, como é óbvio, a «Lisboetas», de Sergio Trefaut. O grande blockbuster do ano - «O Código Da Vinci», de Ron Howard – também apareceu por esta altura, cumprindo os objectivos para que foi feito. Agradou-me «O Novo Mundo», de Terrence Malick, ainda que me tenha parecido algo distante da genialidade do anterior «A Barreira Invisível». Da cinematografia francesa, François Ozon brindou-nos com uma história comovente, mas algo óbvia, em «O Tempo que Resta». A grande surpresa, pelo menos para mim, foi «A Vida Secreta das Palavras», de Isabel Coixet – um filme de uma sobriedade espantosa, mas de nos deixar… sem palavras.
Passando ao terceiro trimestre, constato a hegemonia dos filmes relacionados com a guerra no Iraque ou com os atentados ao WTC. O ano tinha começado com «Máquina Zero», de Sam Mendes, demasiado colado a outros filmes do género, vindo a confirmar-se nos meses seguintes a inclinação para o filme de guerra ou a temática associada. Vejamos: «Voo 93», de Paul Greengrass; «A Caminho de Guantánamo», de Michael Winterbottom e Mat Whitecross; «World Trade Center», de Oliver Stone. Arriscaria afirmar, se não me levarem a mal, que de todos o melhor filme de guerra foi mesmo o documentário «Uma Verdade Inconveniente», de Davis Guggenheim, libelo ambientalista que dá voz às preocupações de Al Gore. A destoar desta tendência, salientaria «Voltar», de Pedro Almodóvar, um filme algo decepcionante tendo em conta outras obras do mesmo realizador. Não vi «A Senhora da Água».
E pronto, assim chegámos ao último trimestre de 2006. Direi apenas: «Juventude em Marcha», de Pedro Costa. Não digo mais nada, não me apetece dizer mais nada.